Um legado

Inezita morreu em 8 de março de 2015, um domingo, dia de Viola, Minha Viola. Fazia apenas três meses que ela havia deixado de apresentar o programa. Foram mais de 60 anos de carreira, dividindo-se entre pesquisadora, apresentadora, instrumentista, professora, atriz, radialista e, sobretudo, cantora. Sua história na música é preenchida com mais de 80 discos, além de uma contribuição difícil de contabilizar no que diz respeito ao espaço proporcionado à música caipira e folclórica, por mais de 35 anos, em uma produção semanal na TV aberta.

No cinema, participou de cinco filmes, inclusive o primeiro brasileiro em cores, Destino em Apuros (1953). Sua trajetória rendeu reconhecimentos importantes, como o Prêmio Saci de Cinema, além de ter conquistado sete vezes o Prêmio Roquette Pinto na categoria Melhor Cantora de Rádio. Afastada da mídia, em um período de reclusão, não só deu aulas de violão, como também se tornou pesquisadora da música folclórica brasileira e passou a lecionar em universidades.

Mais do que um legado físico, baseado na sua produção, Inezita se transformou em uma referência. Para a música e a cultura caipiras, para o folclore, para a academia e também para as mulheres. Em entrevista para esta Ocupação, sua filha, Marta Barroso, disse: “Ela sempre foi assim, fora da casinha; coisas que mulheres daquela época não faziam, ela fazia”. Em um cenário no qual o gênero poderia limitar e definir o lugar e as obrigações das mulheres, Inezita não ponderou sobre o estabelecido e o que ela gostaria de fazer.

foto: Cedoc TV Cultura

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Inezita Barroso, a vida [Capítulo: Um legado]

Por Paulo Freire*

*Curador da Ocupação Inezita Barroso, Paulo Freire conta aqui a história de uma vida. Uma vida de 90 anos, muitas músicas e muitos “causos”. Dividida em seis capítulos (A menina, A família, A artista, A pesquisadora, Eta programa que eu gosto e Um legado), essa história se espalha pelas seções do site. Um passeio pela vida e pela obra daquela que é uma das artistas mais importantes da cultura popular brasileira. 

Inezita Barroso tornou-se a principal referência da cultura do interior do Brasil. Com um repertório de canções que parecia infinito, gravou mais de 80 álbuns – entre vários formatos de discos e também CDs –, tinha um conhecimento profundo das manifestações tradicionais, dava aulas, palestras e recebeu um número imenso de homenagens por onde passou.

Certamente Inezita Barroso é mais conhecida como uma intérprete de músicas caipiras, mas ela ia muito além. Pesquisava, cantava e registrava canções do mar, caipiras, nordestinas, temas afro-brasileiros e danças brasileiras. Ela dizia: Folclore é a expressão mais autêntica da arte de um país. Música folclórica é aquela que nasce do povo. Não é composta para o povo, é o processo inverso: o povo faz a música”.

Era impressionante a capacidade que Inezita tinha para se relacionar com pessoas tão diversas. Cantou modinhas com o presidente da República; conviveu e dividiu o palco com diversos artistas, da importância de um João Pacífico ou um Luiz Gonzaga; travou amizade com um frentista no interior da Bahia (o rapaz cantava um ponto de capoeira enquanto limpava o pátio do posto, e Inezita corria atrás dele anotando a melodia em seu caderno); repetiu milhares de vezes para milhares de fãs as músicas “Lampião de Gás” e “Moda da Pinga”; recebeu toda a estima e a reverência de um ator como Paulo Autran; e inté buscou de carro um violeirinho iniciante para participar de seu programa de rádio. O violeirinho nem disco tinha, só uma fita cassete, e esse desorientado não sabia como chegar à rádio. Então a grande Inezita foi buscar o menino (no caso eu!) numa esquina de São Paulo e o levou para o estúdio…

Em 8 de março (Dia Internacional da Mulher!) de 2015, partiu Inezita Barroso. Ela havia acabado de completar 90 anos. Muitas noites olho para o céu e busco a estrela mais brilhante. E percebo que ainda vai custar um bocado para conseguirmos ter a dimensão real do que Inezita representa. Por sua história de vida, sua postura artística e pelo chão que oferecia a todos nós.

Inezita Barroso é a voz da nossa terra.

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Um legado

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Ao longo da carreira, Inezita Barroso gravou mais de 80 álbuns | foto: Cedoc TV Cultura

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Para ouvir

A música pode ser considerada uma das principais companheiras de Inezita Barroso durante toda a sua vida. Na TV, no rádio, na sala de aula ou nas pesquisas, foram os ritmos das canções caipiras, dos xotes, das modas e de outros gêneros que moveram a cantora paulistana em seus mais de 50 anos de carreira.

Para celebrar essa união, a cantora e a música, o Itaú Cultural preparou duas playlists: Inezita Canta e O Mundo de Inezita. Enquanto a primeira traz gravações realizadas em diversas épocas da vida da homenageada, a segunda traz nomes que Inezita fazia questão de ressaltar em entrevistas, nas aulas que dava, no rádio e na TV.

Confira as playlists abaixo:

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Eu vos receito Inezita

Imagens cedidas pela Fundação Padre Anchieta (TV Cultura) para a Ocupação Inezita Barroso

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Voltem sempre

Imagens cedidas pela Fundação Padre Anchieta (TV Cultura) para a Ocupação Inezita Barroso