Iniciativa apoiada pelo Rumos e idealizada pelo grupo Semente Cinematográfica se volta a implementar escolas experimentais de cinema em instituições de ensino da Paraíba
Publicado em 30/08/2019
Atualizado às 15:27 de 04/09/2019
por Marina Lahr
Desde 1895, ano em que os irmãos Louis e Auguste Lumière passaram a disseminar o uso do cinematógrafo – máquina criada para filmar e projetar imagens –, o cinema ocupa um lugar especial no imaginário da mente humana. Com o status de sétima arte e fonte dos mais diversos formatos de investimento, a indústria cinematográfica é, hoje, uma das formas de cultura que mais se solidifica frente a um cenário extremamente audiovisual.
Ainda que sejam vistos essencialmente como um meio de entretenimento, os filmes possuem muito mais que uma função recreativa, sendo também base para estudos e pesquisas no campo da educação. Essa ramificação da cultura fílmica foi o que atraiu Ana Bárbara Ramos, cineasta e arte-educadora, e Felipe Leal Barquete, cineasta, arte-educador e pesquisador, que decidiram mergulhar em uma iniciativa capaz de conciliar o conhecimento proporcionado pela cinematografia com práticas educativas inovadoras.
Em 2014 surgiu, assim, o Semente Cinematográfica, criação voltada a desenvolver as possibilidades didáticas do cinema. Com mais de dez projetos realizados ou em andamento, o Semente tem foco de atuação na Paraíba e trabalha com experiências multíplices, que vão desde a implementação de Escolas Experimentais de Cinema (EEC) em instituições de ensino – com a capacitação de professores – até oficinas de prática cinematográfica e mostras de cinema e educação.
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Felipe Barquete explica que o grupo é fruto da união de pessoas que já trabalhavam com produção cinematográfica e outras atividades de formação audiovisual, como cineclubes e oficinas, e que a possibilidade da inserção do audiovisual na educação – vinculada a uma perspectiva pedagógica consistente – estimulou os integrantes a se aprofundarem no tema, pesquisando outras referências e desenvolvendo novas metodologias a partir do diálogo entre as áreas.
“Em um contexto de crises, de transformações profundas e intensas e de surgimento de novas dinâmicas de comunicação e possibilidades educacionais, trabalhamos com o objetivo de consolidar novos modos de educar e criar, que levem em consideração o resgate da motivação de educadoras e educandos, fazendo com que a tecnologia possa estar a serviço do desenvolvimento humano”, justifica o idealizador.
Com o desejo de amplificar o trabalho realizado no estado nordestino, o Semente Cinematográfica buscou o apoio do Rumos Itaú Cultural, sendo selecionado no edital 2017-2018 do programa para ramificar as ações de educação audiovisual.
“A ideia do projeto Rumos surgiu como desdobramento do trabalho com cinema e educação nas escolas públicas dos territórios quilombolas de Gurugi e Ipiranga (Conde/PB)”, conta Felipe. “Nessas escolas, nós implementamos Escolas Experimentais de Cinema (EEC) e, desde 2016, produzimos oito filmes resultantes de um processo criativo e educativo que transcendeu os limites da instituição. A possibilidade de expandir essa experiência bem-sucedida para outros contextos sociais e educativos do estado da Paraíba foi o que nos motivou a inscrever a proposta.”
Em Cartografia de Imagens: Filme-carta, Formação e Experimentação – como ficou denominada a iniciativa –, Felipe, Ana e outros integrantes do Semente se dedicam a concretizar a instalação das EEC em quatro instituições distintas do Estado – escolhidas, principalmente, a partir de critérios de singularidade – e a desenvolver metodologias com o objetivo de contextualizar as práticas de cinema na realidade social e educacional de cada uma delas.
Atualmente, o projeto está na fase de finalização dos cursos de formação audiovisual, os quais foram dividos em cinco módulos. O primeiro, realizado em João Pessoa, contemplou todas as instituições inscritas no edital de seleção; os demais foram realizados exclusivamente nos quatro territórios das instituições contempladas, mas abertos para educadores das entidades não contempladas. Após as oficinas está prevista a realização de mostras de cinema e educação em cada escola, com o objetivo de exibir o resultado do projeto para as comunidades escolares.
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A perspectiva de trabalhar com o audiovisual nas escolas é uma ideia que vem sendo cada vez mais popularizada a partir do desenvolvimento da tecnologia, como esclarece Felipe. Para o cineasta, o conceito de cultura visual se torna mais palpável à medida que a mediação das redes sociais e os novos modos de comunicação na sociedade se consolidam como dispositivos de subjetivação dos jovens e das crianças. Nesse contexto, a sociedade deixa de ser apenas consumidora de imagens e sons, se tornando também produtora e transmissora, especialmente com o advento das mídias digitais.
“A possibilidade de publicizar pensamentos e estéticas de vida, formar opiniões e se articular em redes globais de informação faz com que o regime de comunicação contemporâneo seja objeto de reflexão e cuidado por parte de profissionais da educação. É nesse cenário que uma pedagogia do audiovisual se torna relevante no contexto escolar formal e não formal”, reflete Felipe.
Ao exibir filmes nas escolas, sobretudo filmes brasileiros, o Semente Cinematográfica se propõe a democratizar o acesso às diferentes sensibilidades humanas e estéticas de vida, o que favorece, segundo Felipe, um processo educativo voltado para o exercício da cidadania, o respeito às diferenças e a formação do gosto e do repertório cultural, fundamentais para o aproveitamento pleno das potencialidades intelectuais, sensíveis e artísticas dos educandos.
“No cenário atual da educação, faz-se necessário buscar novas formas de educar, e a arte e a tecnologia podem ser grandes aliadas nesse processo. Cartografia de Imagens é um impulso ético, estético, político e pedagógico para plantar flores onde antes não havia. Procuramos nos posicionar num lugar fértil, em que outras e novas estéticas e discursos possam ser produzidos, de modo que as influências do cinema e da educação se cruzem e façam germinar hibridizações em formato de cinema.”