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Cotas e ação afirmativa

Há mais de dez anos a Universidade Federal da Bahia (UFBA) tem debatido e implementado políticas de cotas e ação afirmativa. Em conversa...

Publicado em 07/12/2015

Atualizado às 10:18 de 03/08/2018

Há mais de dez anos a Universidade Federal da Bahia (UFBA) tem debatido e implementado políticas de cotas e ação afirmativa. Em conversa com o Observatório, o pró-reitor e especialista no tema Penildon Silva Filho nos contou como essa questão veio à tona na instituição e fala sobre seu processo de implantação e acompanhamento.

(Foto: Tatiana Mendes Sena)

 

A Universidade Federal da Bahia (UFBA) foi uma instituição pioneira na implementação da política de cotas. Como se deu esse processo e qual é a importância desse tipo de política?

O debate sobre políticas de ações afirmativas e a implementação da política de cotas na UFBA começaram em 2003, provocados pelo Centro de Estudos Afro-Orientais [Ceao], com a publicação de estudos e artigos que indicavam e debatiam as desigualdades existentes no Brasil sob o ponto de vista econômico e racial. A universidade adotou as ações afirmativas em 2004, e em 2005 elas começaram a ser aplicadas. O Programa de Ações Afirmativas envolvia: 1) a preparação para o ingresso, com apoio aos cursos pré-vestibulares populares; 2) as cotas no ingresso; 3) políticas de permanência para propiciar a manutenção do aluno cotista na instituição; e 4) o acompanhamento dos egressos após a sua formação.

Outras universidades públicas e institutos federais também adotaram políticas com o objetivo de democratizar o acesso à universidade e garantir direitos a esse grupo historicamente excluído. No caso da UFBA, houve a opção em utilizar o critério de ser estudante de escola pública e respeitar, dentro desse contingente, o perfil étnico-racial da população do estado. Com a aprovação da Lei Federal no 12.711, de 2012, a esses dois critérios – ser de escola pública e respeitar o percentual de negros nesse contingente – foi acrescentado o critério de renda, pois agora 50% das vagas são reservadas a estudantes de escolas públicas, e destes metade deve ser de famílias que têm até 1,5 salário mínimo de renda per capita.

Quais evidências podem ser vistas a partir das políticas de cotas e ação afirmativa na UFBA? Existe algum estudo que demonstre o impacto dessas políticas?

Há vários estudos na UFBA e fora dela dando conta de que hoje a universidade é um local mais rico culturalmente, plural e democrático. Conseguimos democratizar o acesso a todos os cursos, inclusive àqueles que historicamente eram monopolizados pela elite branca e rica de nosso país. Começou-se a promover inclusão e maior equidade entre pessoas de diferentes classes sociais e cor, garantindo que as oportunidades sejam mais acessíveis a todos, e não a uma minoria. Logo após a implantação das cotas, os dados dos diversos cursos da UFBA indicavam que na maioria deles o desempenho dos cotistas era superior ao de estudantes não cotistas. Hoje não se identifica uma diferença significativa entre negros e brancos no rendimento na UFBA, em média. Dessa maneira, é possível tornar a elite dirigente nacional mais diversificada com as cotas, fortalecendo a autoestima de grupos historicamente discriminados sem perder a excelência acadêmica.

Qual é a repercussão da política de cotas e quais debates são colocados, hoje, a partir disso? Esse debate se estende para além da universidade?

O grande desafio hoje é garantir a permanência acadêmica, material e simbólica dos alunos. Não basta garantir o acesso; deve haver condições materiais para que o estudante possa se manter na instituição, e hoje há muito mais apoio da assistência ao estudante pelo Programa Nacional da Assistência Estudantil [Pnaes]. Ao mesmo tempo, a implantação das cotas tem permitido um debate sobre o “mito da democracia racial” que muito se estabeleceu na sociedade brasileira, descortinando os processos de discriminação e preconceito que estruturam a sociedade brasileira e que reproduzem uma situação de privilégios para muito poucos, sempre uma minoria branca.

Como você enxerga essa questão sob o recorte das políticas culturais? Elas atendem às demandas da população negra?

Sobre as políticas culturais, a universidade tem o desafio de ser um espaço mais diverso e que respeite a diversidade cultural de nosso povo, deixando de ser um espaço de reprodução da cultura de apenas uma classe social, que sempre teve uma etnia muito marcada no Brasil. Há algumas iniciativas de permitir um diálogo maior com essa pluralidade cultural e social, mas ainda precisamos avançar para permitir maior sentimento de pertencimento de todos os alunos à UFBA e uma identificação dos alunos com a instituição.

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