"Melodia-a-Dia de Circo" é um dos projetos contemplados pelo programa Rumos Itaú Cultural 2017-2018
Publicado em 15/07/2019
Atualizado às 15:32 de 01/10/2021
por Ana Luiza Aguiar
Ninguém melhor para contar a história da arte encenada em picadeiros e sua relação com a música do que os circenses. O registro dessa narrativa, por meio da produção de um documentário, é a proposta do projeto Melodia-a-Dia de Circo, contemplado pelo programa Rumos Itaú Cultural.
Idealizada pela circense, acordeonista e socióloga Lívia Mattos, a produção cinematográfica reunirá 47 entrevistas, dados históricos e imagens de acervo capazes de traduzir a multiplicidade artística representada em diferentes linguagens sob as lonas.
"A música acaba sendo uma ferramenta de expressão que amplia a sociabilidade, a divulgação, as formas de fazer espetáculos e a estética da arte circense. Num mesmo espetáculo, é possível ouvir pop radiofônico, música erudita ocidental, repertório clássico circense, músicas instrumentais, ciganas, judaicas, caipiras, sertanejas. Tudo é possível quando se trata de circo", afirma Lívia ao defender a opção pela música como destaque.
O Melodia-a-Dia de Circo dará continuidade a um trabalho de pesquisa e documentação iniciado em 2012, Música do Circo, o qual reúne entrevistas com circenses veteranos, que compartilham suas experiências de artistas diante da câmera. A riqueza do material impulsionou o desenvolvimento do novo projeto, que propõe registrar a arte circense nacional dando voz a quem a cultiva e não a deixa morrer.
O trabalho privilegia a oralidade e objetiva registrar e difundir a experiência de artistas considerados mestres circenses. A seleção de entrevistados prioriza aqueles que "guardam na memória segredos, repertórios de músicas e números, truques, alegrias e tristezas, histórias de vida, que são verdadeiros roteiros cinematográficos de quem tinha a lona como casa e local de trabalho", explica a idealizadora da proposta.
Em sua trajetória de pesquisa acadêmica, de artista circense e instrumentista, Lívia encontrou personagens que, segunda ela, “carregam a serragem na veia”, que falam de resistência às dificuldades e de alegrias. Nas palavras da pesquisadora, o circense é, pela natureza do seu ofício, um ser disposto. “O que acho mais lindo nos depoimentos é sentir que o alimento do seguir é a esperança de que na próxima praça seria melhor do que na que se estava. Todos falam isso. Podem estar sob a lona rasgada, sem ter o que comer, sem dinheiro para sair de onde se está, mas seguem com a esperança de que a próxima cidade, ou bairro, será melhor."
Além da experiência dos entrevistados, o documentário refletirá a vivência de sua idealizadora, já que o circo também faz parte de sua história de vida. Lívia despertou para a arte circense aos 16 anos. Em Salvador (BA), entrou para a Companhia Picolino, onde ficou por seis anos, viajando pelo Brasil com diversos espetáculos.
As pesquisas que resultaram no seu projeto começaram na faculdade de ciências sociais, quando ela começou a entrevistar circenses veteranos. A partir da interface entre circo e música – unindo sanfona, acrobacias e vida acadêmica –, Lívia fundou a Fulanas Cia. de Circo e a Cooperativa de Circo da Bahia; em São Paulo, integrou o Acrobático Fratelli. Também criou projetos como A Sanfonástica Mulher-Lona, Mono Amour e Sanfona Aérea. Em 2017, lançou o álbum autoral Vinha da Ida (Natura Musical), além de participar do programa OneBeat 2017, apresentando-se em quatro estados norte-americanos – com 25 músicos de 17 países diferentes. Ainda acompanha artistas como Chico César, Rosa Passos e Badi Assad, e faz shows em parceria com Ceumar e Alessandra Leão, além de produzir trilhas para espetáculos e audiovisual.