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Leda Rainha

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“Eu sou o que me costura”

Nascida no Rio de Janeiro em 1955, Leda Maria Martins tornou-se uma das mais importantes pensadoras nas áreas do teatro, performance, literatura e culturas populares da diáspora africana. Filha de Alzira Germana Martins – cuja família convivia intensamente na cena do samba e das escolas de samba carioca –, cresceu envolta na musicalidade e na performatividade negra, tanto do samba quanto do reinado e do congado.

Leitora ávida e afeita aos estudos, Leda aprendeu a ler aos quatro anos de idade, e aos sete já começava a escrever seus primeiros poemas. Também sempre foi apaixonada por matemática, paixão que sempre quis compartilhar com os outros, tornando-se professora particular ainda criança, ofício que só deixaria de realizar após concluir o mestrado em artes.

Por conta de problemas de saúde de Leda durante a infância, Dona Alzira – grande devota de Nossa Senhora do Rosário – fez uma promessa: se a filha se recuperasse, a pequena seria princesa Conga no Reinado por sete anos. 

Na juventude, Leda e sua mãe mudam-se para Belo Horizonte. Primeiramente para cumprir a promessa feita por Alzira anos antes e coroar sua filha como Princesa Conga: “ela queria que eu cumprisse a promessa e, sendo mineira, sabia que Minas é terra de reinado. Ela tinha sido do reinado de Carmo de Cajuru, perto de Itaúna e Divinópolis, e me trouxe do Rio de Janeiro para ser batizada pelos reinadeiros de lá. Belo Horizonte ela não conhecia, mas um dia alguém falou que lá nos confins da cidade tinha um reinado que era comandado pelo senhor Virgulino, o Capitão Virgulino, e por Dona Maria”, conta Leda. Foi em Belo Horizonte, na Irmandade de Nossa Senhora do Rosário do Jatobá, que Leda foi coroada Princesa Conga, função exerceu por dez anos, quando abdicou de sua coroa, ainda permanecendo como parte da irmandade. Em 1992, Alzira seria coroada como Rainha de Nossa Senhora das Mercês, função que, treze anos mais tarde, seria transmitida à sua filha.

Terminando sua formação escolar, e mesmo com as dificuldades financeiras da família, Leda decidiu prestar o vestibular – muito incentivada por sua mãe – e ingressou no curso de Letras na Universidade Federal de Minas Gerais em 1974. Sua excelência acadêmica a levou a ingressar no mestrado em Artes na Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, em 1978, onde defendeu a dissertação O moderno teatro de Qorpo Santo, publicada posteriormente pela editora da UFMG.

Durante sua estadia nos Estados Unidos, se deparou com a obra Drama para negros e Prólogos para brancos, uma coletânea de textos dramáticos organizados por Abdias Nascimento e encenados pelo Teatro Experimental do Negro (TEN). “Era a primeira vez que eu me defrontava com peças em que o negro era o tema central, era o protagonista. Isso era inusitado para mim, porque conhecia razoavelmente bem o teatro brasileiro”, diz Leda no livro Memórias e percursos de professores negros e negras na UFMG, publicado em 2009 pela Editora Autêntica. 

De volta ao Brasil, em 1981, a pesquisadora foi convidada a implantar o curso de Letras na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), onde permaneceu até 1983, lecionando Literatura Brasileira e Teoria da Literatura. Em 1983, Leda publicou seu primeiro livro de poesia Cantigas de amares, lançado independentemente. Ela ainda publicaria Os dias anônimos, pela editora Sette Letras, em 1999.

Marcada pela leitura da obra de Abdias, Leda ingressou no doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em 1987 onde desenvolveu uma pesquisa sobre a trajetória do Teatro Experimental do Negro e a formação do Teatro Negro nos Estados Unidos. A tese defendida por Leda dá origem ao livro A cena em sombras, publicado em 1995 pela editora Perspectiva. Leda se tornaria professora da Faculdade de Letras da UFMG em 1993, onde permaneceria até 2018.

Ainda em 1993, Leda recebeu uma importante tarefa do capitão-mor da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário do Jatobá, João Lopes: escrever a história do Reinado do Jatobá, suas origens, seus cantos e seus rituais. Sua pesquisa resultou nas reflexões teóricas presentes em Afrografias da Memória, livro publicado em 1997 pela Mazza Edições e pela Editora Perspectiva.

Entre 1998 e 1999, Leda presidiu a comissão de criação do curso de Graduação em Artes Cênicas da UFMG e a comissão de implantação do Curso de Graduação em Artes Cênicas da mesma universidade. É também em 1999 que a pesquisadora iniciou seu primeiro pós-doutoramento na Universidade de Nova Iorque (ela faria outro na mesma universidade em 2009). Leda também foi professora visitante nesta mesma universidade, onde desenvolveu ainda mais suas pesquisas em Estudos da Performance e estabeleceu grandes parcerias profissionais.

Na virada do século XXI, Leda começou a desenvolver uma de suas mais marcantes pesquisas, enraizada na cosmologia e na filosofia africana e nas diversas pesquisas que realizou sobre a cultura africana e afrodiaspórica,  abordando o conceito de tempo espiralar. Essa pesquisa deu origem ao livro Performances do tempo espiralar: poéticas do corpo-tela, publicado pela editora Cobogó em 2022. O conceito de tempo espiralar foi tema, em 2013, de um grande simpósio na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, contando com a participação de artistas e pesquisadores de diversas áreas.

Com uma trajetória artística e acadêmica notável, Leda foi homenageada com a criação do Prêmio Leda Maria Martins, em 2017, que reconhece e celebra as artes brasileiras a partir dos principais conceitos trabalhos pela intelectual em seus trabalhos: encruzilhada, muriquinho, oralitura, corpo adereço, performance do tempo espiralar, lugar da memória, afrografia, cena em sombras, palco em negro, ancestralidade e corpo-tela.

Em 2022, Leda foi agraciada com o Prêmio Milú Villela – Itaú Cultural 35 Anos, que celebrou dez figuras de destaque na arte e na cultura, em reconhecimento às suas trajetórias. Além de Leda, foram premiados o lavrador, poeta, escritor, professor, ativista político Nego Bispo, a fotógrafa Claudia Andujar, a atriz Léa Garcia, a cantora e compositora Cátia de França, o grupo teatral Ó Nóis Aqui Traveiz, o gestor cultural e sociólogo Danilo Santos de Miranda, a publicitária e ativista Neon Cunha, a cantora e professora Inaicyra Falcão e o líder indígena Marcos Terena.

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Ficha de testes para a admissão de Leda Maria Martins no Ginásio Domiciano Vieira, no bairro Barreiro, em Belo Horizonte (MG), em meados de 1960

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Apresentação | Videoguia em Libras

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"Olha para você ver!": quando morei na conversa de Leda

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Formatura de graduação de Leda em letras, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em 1977. Da esquerda para a direita, ela é a quarta pessoa da primeira fileira | Acervo pessoal

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A rainha que dança: os passos que marcam sentimento e tradição

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Prêmio Milú Villela – Itaú Cultural 35 anos

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“Eu quero um dia ter a honra de alguém olhar para mim como eu olho para ela. Porque sei a importância disso. Não é só uma admiração profissional, é uma admiração pela existência dessa pessoa e a importância que essa existência tem para o mundo".

Tatiana Tiburcio

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Leda no Jatobá, em Belo Horizonte (MG), 1976 | Acervo pessoal

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série Trajetórias

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Tudo o que me constitui

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