O Cantadô pede Licença
Utilizando-se a metáfora do tecido, um tecido musical, a obra de Elomar se mostra como um grande texto em dobras, uma tessitura polifônica que se dobra, desdobra e redobra sobre si mesma em movimento contínuo.
Sua música se configura, portanto, como um organismo vivo, modulante: um corpo. Desobediente a preceitos canônicos, reúne amarrações, parcelas, puluxias, desafios, galopes (gêneros de cantorias de viola e repente) e composições como antífonas (tipo de música litúrgica), concertos, sinfonias e óperas.
Alinhavando essas dobras, o músico se coloca em conversação com tradições desterritorializadas, nômades: de uma Europa medieval, que se torna muito próxima, em cantigas de amigo e de amor e em pastorais; passando por uma África em diáspora nos batuques e na chula; até retornar para a Europa teatralizada do concerto barroco e do gênero operístico. Tudo isso transitando por tensões e harmonias possíveis num sertão povoado por vozes, acentos, sotaques. Um sertão povoado por vidas em passagem.
Transfigurando os gêneros musicais e subvertendo as noções lineares de tempo, essa música, geralmente – e equivocadamente – circunscrita a uma denominação regional, é elaborada para além de fronteiras. É portal e errância. De raiz mestiça, caminha e agrega, sem distinção, influências populares e eruditas, estabelecendo um novo paradigma no cenário da música brasileira do século XX em diante.
Dividida em dois núcleos, o cancioneiro e a música culta, mantém-se viva e pulsante, mesmo tendo seu último registro (o disco de carreira Cantoria 3) lançado há 20 anos.
Seção de vídeo
As canções elomarianas
João Omar é filho de Elomar, maestro e músico. É graduado em composição e regência e mestre em regência orquestral pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Estudou regência com abordagem na fenomenologia da música pela l’Association Celibidache na República Checa.
Discografia
1968 – O Violeiro/Canção da Catingueira (compacto simples)
1972 – Das Barrancas do Rio Gavião (Phillips)
1979 – Na Quadrada das Águas Perdidas (Marcus Pereira, LP)
1979 – Parcela Malunga (Marcus Pereira, LP)
1981 – Fantasia Leiga para um Rio Seco (Rio do Gavião, LP)
1982 – ConSertão. Um Passeio Musical pelo Brasil (Kuarup, LP)
1983 – Auto da Catingueira (gravadora e editora Rio do Gavião, LP)
1983 – Cartas Catingueiras (gravadora e editora Rio do Gavião, LP)
1984 – Cantoria 1 (Kuarup, LP)
1984 – Cantoria 2 (Kuarup, LP)
1985 – Sertania (Kuarup, LP)
1986 – Dos Confins do Sertão (Trikont, LP)
1988 – Concerto Sertanez (LP)
1989 – Elomar em Concerto (Kuarup, LP)
1992 – Árias Sertânicas (Rio do Gavião, LP)
1995 – Cantoria 3 (Kuarup, CD)
Seção de vídeo
As Influências
Heraldo do Monte é compositor e instrumentista. Iniciou a carreira na década de 1950 no Recife. Em São Paulo trabalhou com Walter Wanderley e Dolores Duran, além de gravar discos solo, como Heraldo e Seu Conjunto (1960) e O Violão de Heraldo do Monte (1970). Em 1982 lançou com Elomar, Arthur Moreira Lima e Paulo Moura o LP Consertão.