Milton Santos, s.d. | imagem: Marcelo Escobar
Um intelectual engajado
O retorno ao Brasil
De volta ao Brasil após 13 anos de exílio, Milton retornou planejando sua reintegração na Universidade Federal da Bahia (UFBA), que não o aceitou. Cogitando regressar à França, o geógrafo foi convidado por Maria Adélia Aparecida de Souza, também geógrafa e sua amiga, para trabalhar em São Paulo, primeiro como convidado da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/USP) e em seguida como consultor da Ação Regional do Estado de São Paulo – em que Maria Adélia era coordenadora. Em 1979, passou a lecionar na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde ficou até 1983, quando prestou concurso para professor titular do Departamento de Geografia da USP. Em 1987, sob sua liderança e de Maria Adélia, foi criado o Laboratório de Geografia Política e Planejamento Territorial e Ambiental da USP, o Laboplan, que até hoje realiza estudos teóricos sobre urbanização e metropolização.
Seção de vídeo
As contribuições de Milton para a geografia
Milton Santos foi um dos principais expoentes da renovação do pensamento geográfico, entendendo a área não só como uma disciplina técnica descritiva, mas como um campo de reflexão teórica e crítica. Sua importância nessa história é contada neste vídeo por geógrafos e amigos, como Maria Adélia Aparecida de Souza, Billy Malachias e Monica Arroyo.
“O problema é que os geógrafos sempre tiveram dificuldade para fazer teoria e a geografia sempre foi, de um modo geral, uma disciplina que se contentou com a abordagem empírica. Assim, a discussão do objeto não se dava com a extensão, a profundidade e a força que deveria ter.”
Milton Santos, no livro "Testamento Intelectual"
Milton Santos em viagem ao Japão, s.d. | acervo da família
Por que uma geografia nova?
Milton Santos retornou do exílio em 1978, munido de uma experiência de mais de uma década de debates e trabalhos analíticos que estruturaram uma nova maneira de interpretação das realidades impactadas pelo desenvolvimento urbano e industrial em diferentes regiões do mundo. Em seu retorno, trouxe pronto um livro que iria gerar um grande impacto nos debates geográficos brasileiros: Por uma geografia nova. A obra consolida um corpus teórico da geografia crítica brasileira, apresentando os fundamentos do pensamento de Milton que serão elaborados mais profundamente em seus livros seguintes, especialmente em A natureza do espaço (1996).
Nesse trabalho, Milton definiu o objeto de estudo da área, esboçando suas possibilidades de interdisciplinaridade, e alçou a geografia ao status de ciência. Essa geografia, com um conjunto atualizado de conceitos base da disciplina, visa compreender um novo período histórico: o período técnico-científico-informacional e a globalização. Com uma nova fase do sistema capitalista, estruturado no aparente encurtamento de distâncias e temporalidades, a geografia deve estar munida de ferramentas capazes de interpretá-la e reconhecer suas desigualdades e especificidades territoriais.
Além da atualização de conceitos base da disciplina, Milton incorporou conceitos de outras áreas, como a sociologia e a filosofia e os retrabalhou diante das necessidades dessa nova empreitada geográfica, atualizando pensamentos fundamentais para a compreensão da sociedade capitalista por meio da ótica do território e de seus usos.
Tal renovação proposta por Milton ocorreu em um período em que a luta pela redemocratização em diversos países se manifestava de maneira mais contundente e frutífera. Tal atmosfera social se refletiu também na produção intelectual da época e nas lutas pela redemocratização do próprio espaço universitário, o que abre caminho para conceitos mais progressistas no campo científico, os quais buscavam ideais de liberdade e igualdade social. O pensamento Miltoniano, cujas bases são lançadas em Por uma geografia nova, se mostra comprometido com os “de baixo”, a esfera mais pobre, que sofre com a desigualdade e onde, segundo o geógrafo, reside a verdadeira força capaz de criar um novo mundo, mais humano e igualitário.
Seção de vídeo
A renovação de conceitos
Em sua trajetória intelectual, Milton Santos resgatou conceitos base da geografia e os renovou, dando destaque não só aos aspectos descritivos e empiristas da área, mas se debruçando sobre o papel crítico e teórico do pensamento geográfico. Neste vídeo, os geógrafos Billy Malachias, Maria Adélia Aparecida de Souza, Monica Arroyo e Itamar Vieira Junior explicam os principais conceitos e contribuições de Milton.
“O geógrafo teorizador seria aquele que, diante da multiplicidade de situações, encontra fios condutores comuns, que seriam os conceitos”
Milton Santos, no livro "Testamento Intelectual"
Milton recebendo o título de professor emérito da Universidade de São Paulo (USP), 1997 | imagem: Douglas Mansur