texto do curador
Ao contrário das xícaras, das cadeiras, dos postes, dos tratores e dos porta-aviões que as indústrias nos entregam prontos e em séries iguais, as grandes obras de arte são, de certo modo, inacabadas. E isso acontece porque nunca cessam de nos surpreender, de puxar pela nossa inteligência, chamando-nos a atenção para aspectos novos, delas e, feitas as contas, de nós mesmos. Cada obra de arte é uma aventura que só se completa com a leitura de quem entra em contato com ela.
Há também o fato de que aqueles que a produzem, os artistas, sejam perpetuamente insatisfeitos: terminada uma obra, eles, mesmo sem o pedido de ninguém, indiferentes ao mercado, partem para o trabalho seguinte, o que é um modo de tratar da sua insatisfação, dilatando infinitamente sua pesquisa. Por isso é que cada obra dialoga com as anteriores, mesmo que seja bem diferente delas.
É isso que leva Nelson Leirner a trazer obras realizadas nos anos 1960 – O Porco, Matéria e Forma (tronco e cadeira), Homenagem a Fontana II e Stripencores – para colocá-las ao lado de outras produzidas agora. O leitor deve considerar que as produções de 40 anos atrás têm história própria e foram igualmente responsáveis pela amplitude crítica do seu trabalho, da sua procura em alargar o território da arte, saindo dos museus e galerias para as ruas e as páginas dos jornais, passando por lojas de armarinhos, praças e ruas. E que as criações recentes dialogam perfeitamente com as antigas. Dialogam porque compartilham o idioma, isto é, são iguais e, ao mesmo tempo, diferentes. Como nós.
Agnaldo Farias
curador