Eduardo Alves, diretor-geral do Observatório de Favelas e coordenador-geral da Escola Popular de Comunicação Crítica (Espocc), comenta as...
Publicado em 08/09/2016
Atualizado às 17:03 de 15/10/2018
Sediado no Complexo da Maré, na cidade do Rio de Janeiro, o Observatório de Favelas é uma organização da sociedade civil com foco em pesquisa, consultoria e ação pública dedicada à produção de conhecimento e a proposições políticas sobre as favelas e fenômenos urbanos. Entre as suas atividades, está a Escola Popular de Comunicação Crítica (Espocc), cuja missão é elaborar conceitos, metodologias, projetos, programas e práticas que contribuam na formulação e na avaliação de políticas públicas voltadas para a superação das desigualdades sociais, em cinco áreas de atuação: políticas urbanas, educação, comunicação, direitos humanos e cultura.
Nesta entrevista, Eduardo Alves, diretor-geral do Observatório de Favelas e coordenador-geral da Espocc, conta um pouco da realidade e dos desafios encontrados na gestão dessas duas instituições.
(Foto: Piê Garcia)
Segundo o histórico por vocês apresentado, o Observatório de Favelas iniciou seus trabalhos visando “de um lado, formar pesquisadores locais nas comunidades e, de outro, ampliar o conhecimento qualificado sobre as favelas e fenômenos urbanos, com o intuito de contribuir para a ruptura com a visão dominante que associa esses territórios prioritariamente à violência, à criminalidade e à pobreza”. Tendo em vista que esses aspectos associados à favela resultam, entre outros tantos fatores, de uma ausência do Estado, qual a relação do Observatório de Favelas com o poder público?
Em primeiro lugar, talvez seja melhor apontar, já de saída, que a própria noção de poder público adotada e trabalhada pelo Observatório de Favelas extrapola uma mera associação com o Estado. Apesar de reconhecer que o Estado tem como responsabilidade e dever o financiamento e a regulação das políticas públicas e, por conseguinte, a garantia e a promoção dos direitos – na medida em que é o gestor do orçamento público, da distribuição dos recursos e da execução dessas políticas –, concebemos o poder público como uma instância composta de atores e práticas sociais plurais e diversos. Dessa forma, alargamos o horizonte conceitual de “poder público” incluindo em seu bojo o empoderamento, de forma mais ampla, dos cidadãos, no âmbito da formulação, execução e avaliação de políticas efetivamente públicas, dividindo com o Estado e com o próprio mercado a responsabilidade pelas tomadas de decisões e pelas escolhas concernentes à gestão pública e à garantia, promoção, expansão e ampliação de direitos.
É nesse sentido que nos colocamos no cenário social e político brasileiro, como um ator político legítimo e fundamental em permanente diálogo com as demais instâncias componentes do poder público, como a iniciativa privada e o vasto campo das organizações da sociedade civil.
Voltando à questão, acreditamos ser necessário perceber melhor a complexidade dessa noção de ausência do Estado. Isso porque, muitas vezes, o que há não é propriamente uma ausência, mas antes uma precariedade ou presença equivocada e incorreta da máquina estatal, que não cumpre efetivamente com seu mandato social no que se refere à garantia e promoção de direitos. Muitas vezes, o Estado atua no sentido oposto, dificultando e restringindo a vivência plena da cidadania e o usufruto dos direitos, que passam a ser, dessa forma, negados aos moradores das favelas e demais territórios populares.
Acreditamos que um dos fatores que contribuem para que esses problemas e equívocos aconteçam diga respeito a um desequilíbrio na participação dos diferentes atores sociais e na correlação de forças envolvidas nos processos de discussão, formulação e proposição das políticas públicas, desde a construção do arcabouço teórico e conceitual, da delimitação e análise do problema, da priorização das demandas sociais a serem contempladas, passando pelas metodologias e pelos modos de abordagem das questões relacionadas aos conjuntos de desafios e metas trabalhados por cada campo problemático e político específico.
Nesse sentido, nós nos posicionamos no contexto social e político contemporâneo como uma organização social de pesquisa, consultoria e ação pública dedicada à produção de conhecimento e de proposições políticas sobre as favelas e os fenômenos urbanos. Buscamos, em nossas ações e iniciativas, afirmar uma agenda de direitos à cidade, fundamentada na ressignificação das favelas. Temos como missão, portanto, a elaboração de conceitos, metodologias, projetos, programas e práticas que contribuam na formulação e na avaliação de políticas públicas voltadas para a superação das desigualdades sociais. E entendemos que, para serem efetivas, tais políticas têm de se pautar pela expansão dos direitos, por uma cidadania plena e pela garantia dos direitos nos espaços populares.
Desse modo, é praticamente impensável realizarmos nossos objetivos e desenvolvermos nossas pautas e proposições sem o diálogo permanente e a incidência positiva nos espaços de discussão e participação social relacionados e constituintes desse poder público tal como apresentado acima. Precisamos necessariamente ocupar de maneira qualificada e constante as instâncias e os dispositivos relacionados aos processos políticos decisórios. E, para isso, mantemos uma relação de diálogo permanente e estratégico em relação ao Estado, ao mercado e à sociedade civil de modo geral por meio da ocupação dos espaços de participação, do desenvolvimento de iniciativas e parcerias variadas e de um trabalho constante de análise crítica e incidência política sobre a realidade, com especial atenção para as favelas e os espaços populares.
Como a equipe do Observatório avalia as políticas públicas culturais para as regiões periféricas na cidade do Rio de Janeiro?
Nos últimos anos, pudemos perceber um nítido movimento de melhora e uma atenção cada vez maior por parte do poder público às regiões periféricas, especialmente na cidade do Rio de Janeiro e de modo particular no campo da cultura, com um notável e crescente investimento em políticas públicas, a reestruturação de muitos dos equipamentos e serviços públicos e a criação e expansão de novos canais e espaços de participação e produção cultural.
Decerto, ainda é pouco diante dos problemas e assimetrias produzidas secular e historicamente na região metropolitana do Rio de Janeiro como um todo, que tradicionalmente elegeu o centro e a Zona Sul da cidade como focos prioritários de investimentos em políticas culturais. Nesse sentido, houve um avanço recente, com um redirecionamento dessa centralidade para a Zona Oeste da cidade, mais especificamente para os bairros da Barra da Tijuca e Recreio dos Bandeirantes e seus arredores.
Muito ainda deve ser feito nessa direção, como a ampliação dos equipamentos, a destinação de um maior montante de recursos e a adoção da cultura como uma prioridade política e um campo estratégico privilegiado tanto no que se refere à redução das desigualdades sociais, por meio do empoderamento de territórios e populações menos favorecidas, digamos assim, quanto ao desenvolvimento econômico da cidade e da região metropolitana como um todo ― assim como do país.
É preciso cada vez mais reconhecer as regiões periféricas em sua potência inventiva, cultural e econômica. Para isso, devemos superar discursos hegemônicos tradicionais que limitam as leituras e análises desses espaços e de seus moradores aos conceitos de falta, carência e violência, trazendo como suporte e modo de atuação pública ações calcadas nas noções de favor e tutela.
Dito isso, dentro do panorama político vivenciado nas últimas décadas, é inegável que a cultura aparece como um dos campos nos quais podemos observar maiores avanços na superação desses discursos, preconceitos e anacronismos e na consolidação de políticas públicas centradas na potência e na inventividade desses sujeitos e territórios.
Comente o alcance da estrutura e dos projetos realizados pelo Observatório (ou em parceria com outros órgãos) tanto na comunidade da Maré quanto em outras comunidades.
Nesses 15 anos de Observatório de Favelas, já tivemos parcerias e realizamos trabalhos com uma infinidade de organizações e regiões diferentes do país e do mundo. É absolutamente impossível quantificar propriamente o número de pessoas direta e indiretamente beneficiadas por essas ações.
Entretanto, de modo geral, podemos apresentar minimamente alguns resultados. Ao longo de seus anos de atuação, o Observatório de Favelas construiu competências, acumulou aprendizagens, recursos e relações fundamentais para a realização de seus objetivos. Destacam-se:
a) excelência na pesquisa (realização de diversos projetos apoiados por órgãos de fomento nacionais e/ou em parceria com universidades); produção no campo acadêmico, realizando pesquisas voltadas para o desenvolvimento cultural, social e econômico dos espaços populares;
b) ferramentas de comunicação e informação (um website, um boletim eletrônico institucional, dois perfis em redes sociais alimentados diariamente); criação de processos de formação técnico-política, tendo em vista ampliação do grau de emancipação dos sujeitos envolvidos;
c) representatividade no campo das organizações da sociedade civil em âmbito nacional e local; coordenação e participação em diversas redes e articulações; trabalhos institucionais desenvolvidos em rede, privilegiando o envolvimento de diferentes atores para o alcance, a reprodutibilidade e a legitimidade das ações;
d) desenvolvimento de tecnologias de diagnósticos sociais (dados primários e secundários, específicos sobre os espaços populares), constituindo alternativas de geração de informações aos órgãos oficiais, que em geral não possuem o alcance necessário para o desenvolvimento de ações específicas (políticas públicas);
e) desenvolvimento de tecnologias sociais na área de comunicação, implementando ações de formação e de geração de trabalho e renda para moradores de espaços populares, em especial por meio da formação da Escola de Fotógrafos Populares e da Espocc;
f) desenvolvimento de tecnologias sociais; elaboração, implementação, sistematização e proposição de metodologias de ações diretas junto a grupos populares, visando a superação de distintas situações de vulnerabilidade social.
A Espocc foi criada em agosto de 2005 para iniciar jovens e adultos de espaços populares em conhecimentos e vivências de teoria, metodologia e linguagens da comunicação popular, visando potencializar sua ação crítica e transformadora. E, em sua proposta pedagógica, há um conceito pouco difundido em outras instituições de ensino, a chamada “publicidade afirmativa”. Comente sobre esse conceito e como ele é trabalhado com os alunos.
Os meios de comunicação têm um imenso potencial para promover a integração da vida urbana e contribuir com a redução das desigualdades sociais, sobretudo quando são capazes de garantir a livre circulação das diferentes manifestações simbólicas e culturais de uma cidade. No Brasil, contudo, e no caso específico do Rio de Janeiro, o saldo da atuação das mídias de ampla abrangência é dramático para as favelas e periferias. Esses espaços populares são geralmente tratados e retratados pelo que não têm, pelos discursos da carência e da ausência, por um olhar de fora que, sem cerimônia, constrói uma representação estereotipada e simplificada, com ênfase quase total na violência e na criminalidade. Há uma produção de estigmas que marcam os espaços populares e seus moradores, reduzindo-os à condição de não cidadãos.
Diante desse quadro, a Espocc busca encontrar caminhos de superação das leituras e representações hegemônicas que dominam o imaginário social em relação às favelas e periferias. Desde 2013, trabalhamos com o conceito de publicidade afirmativa como eixo central da formação de jovens em duas habilitações específicas: audiovisual e criação digital. Conceito em criação na Espocc, a publicidade afirmativa parte dos instrumentos da publicidade promotora do consumo e de bens distintivos para promover valores de sociabilidade, da cultura e do empreendedorismo comunitário e socioambiental.
A publicidade afirmativa não foge da formulação de peças que criem o desejo de consumo, mas tem como foco a produção de peças qualificadas técnica, conceitual e tecnologicamente, para que as pessoas possam ver e ser levadas a consumir um novo estilo de vida, uma ação empreendedora, relações diferentes no território, uma estética humana com uma qualificação diferente da corrente.
Para um fechamento didático, pode-se pensar na seguinte progressão:
a) o trabalho da publicidade, para construir conexão com uma comunicação crítica, precisa ser afirmativo da vida, da humanidade, e não dedicado principalmente à venda de mercadorias e serviços;
b) a publicidade afirmativa é um ofício, uma técnica, uma prática recheada de conteúdos e, portanto, o profissional precisa ter repertório para construir as peças de forma que se aproximem progressivamente do real, com realidades que disputem o universal e criem desejos de consumo nas pessoas;
c) buscar-se afirmar estéticas, empreendedorismos, práticas, em territórios ou para além dos territórios (espaços físicos e simbólicos da cidade), não por meio da negação de possíveis mercadorias, mas por meio da centralidade da práxis em evidência; não é, portanto, em hipótese alguma, uma propaganda de ideias, programas, pensamentos, ainda que tudo isso possa estar impregnado na peça publicitária.
Até mesmo por ser um conceito em criação, a forma de abordagem junto aos alunos segue um processo dialógico de apresentação, debate e incremento das contribuições construídas coletiva e colaborativamente a cada processo formativo.
A discussão sobre publicidade, políticas públicas, comunicação crítica e ações afirmativas sustenta e fundamenta a própria criação e desenvolvimento do conceito, que, além de ser abordado durante as aulas, pode ser posto em prática por meio do trabalho de conclusão de curso, além das diversas tarefas desenvolvidas em sala de aula. Vale ressaltar que todas as ações relacionadas à nossa agência escola, a Agência Diálogos, estão calcadas nas bases e nos axiomas da publicidade afirmativa, fazendo com que esses processos sejam trabalhados ainda mais de maneira coletiva com os alunos de modo geral e, mais especificamente, com os bolsistas selecionados anualmente para integrar a sua equipe técnica.
(Imagem: Divulgação)
Os trabalhos de conclusão dos cursos da Espocc são muito bem estruturados e bem executados [conheça um deles, a Favela 3D, aqui]. Como é o processo de concepção e planejamento? Como se relacionam os estudantes e quais os limites da autonomia deles no projeto?
O TCC da Espocc tem como objetivo principal reunir os saberes adquiridos pelos alunos ao longo da sua formação, bem como os conhecimentos apropriados em suas vivências pessoais e profissionais, com o intuito de desenvolver um trabalho coletivo ao final de cada ciclo formativo. Busca-se, com esse recurso, a construção e o emprego de conhecimentos técnicos, instrumentais e teóricos visando à promoção de causas humanitárias e sociais por meio da temática da publicidade afirmativa.
A produção e a apresentação de projetos finais, realizados por três grupos em cada edição do curso, têm como eixo central a publicidade afirmativa e as dimensões sociopolítica, cultural e de empreendedorismo popular.
A seleção dessas temáticas se dá a partir dos marcos conceituais da publicidade afirmativa, em sintonia com a agenda de direitos e proposições políticas e analíticas desenvolvidas pelo Observatório de Favelas. Os alunos escolhem os projetos/grupos mesclando turmas. Trabalham desde o atendimento ao proponente, produzindo briefings, desenvolvendo pesquisa, diagnóstico, planejamento, protótipos, plano de mídia, monitoramento e avaliação de respostas de comunicação integrada, de viés publicitário (campanha), mas que possam abarcar estratégias articuladas, como produção cultural e relacionamento com a mídia. Mais do que uma simulação em ambiente escolar, trata-se de campanhas reais, com verba, prazos, metas e públicos definidos, contando ainda com apoio de veiculação de parceiros. A avaliação do aluno se dá pela frequência e realização de produtos de comunicação.
O TCC é integralmente desenvolvido a partir da infraestrutura da Agência Diálogos. Atualmente, possuímos uma estrutura limitada, mas necessária (computadores, internet e equipamentos de audiovisual, entre outros), além da presença de técnicos (alguns formados pela Espocc) que dão suporte às atividades. Não obstante essa vinculação, existe a contratação de profissionais que participam como facilitadores.
Desse modo, respondendo objetivamente ao seu questionamento, existe obviamente um limite nas produções dos alunos que diz respeito a um alinhamento político com as prerrogativas da publicidade afirmativa e da própria missão institucional do Observatório de Favelas. Esse limite se efetiva na coletividade do processo, que respeita a autonomia dos jovens na proposição dos temas a serem trabalhados, nas ações planejadas, nas mensagens divulgadas, nos posicionamentos defendidos. Por maior que seja a autonomia dos alunos nesse processo, deve haver uma afinidade e um alinhamento com a visão de mundo proposta pela instituição.
Segundo essa perspectiva, mensagens que possam trazer alguma ambiguidade e intolerância são trabalhadas junto aos alunos, o isolamento e a fragmentação das bandeiras e dos discursos específicos de grupos minoritários são equalizados de modo que todas as vozes possam contribuir e se fazer minimamente escutadas.
Desde 2015, o Observatório de Favelas lida com o direito à convivência e o direito à diferença como motes centrais. Essa abordagem procura ir de encontro com uma tendência identificada nas redes sociais e nos espaços de participação política de acirramento e confronto deliberado a todo e qualquer discurso ou posicionamento diferente ou divergência. Tendência essa extremamente narcisista, agressiva e arrogante, que oblitera e por vezes impede o diálogo e uma convivência pacífica plena entre pessoas e discursos divergentes. Tendência essa que aborda toda divergência e alteridade com beligerância e intolerância e que, a nosso ver, limita a vivência e a ampliação dos direitos.
Para isso, além da constituição de grupos de trabalho acompanhados por profissionais integrantes da equipe técnica, existe um espaço ou fórum geral, com a participação da equipe técnica e da coordenação geral do projeto, em que cada grupo de trabalho apresenta suas propostas e coletivamente são deliberadas as ações, para que seja mantido um processo aberto, dialógico e com uma unidade teórica e metodológica em todas as ações e produtos propostos.
Vale ressaltar ainda a existência de um documento chamado Papo Reto, em que todas essas premissas metodológicas e conceituais são apresentadas e acordadas coletiva e individualmente, como um contrato firmado entre ambas as partes no momento da matrícula.
Os trabalhos de conclusão de curso da Espocc dialogam com as realidades locais da comunidade. Apesar de ter uma proposta de abrir e desmistificar a realidade da favela para moradores de fora da comunidade, como esses trabalhos envolvem a comunidade local que não está na Espocc?
Uma das questões recorrentemente trabalhadas nessas campanhas diz respeito às dificuldades encontradas pelos jovens moradores de favelas e espaços populares na produção e na divulgação de seus trabalhos, assim como a própria forma como a mídia e a sociedade de modo geral os retrata, sempre pelo viés da falta, da carência, da violência. Desse modo, as etapas do TCC geralmente envolvem a comunidade local e moradores de outras favelas e territórios populares, a partir das redes de relações dos próprios jovens alunos da Espocc.
Vale destacar que a escola vem construindo novas representações dos espaços populares e dos seus moradores, na medida em que muitos agentes de formulação e difusão das mensagens são oriundos das próprias comunidades. Pretende-se cada vez mais estimular a atuação de novos atores sociais, pois cabe a eles a afirmação de uma identidade positiva de si e do seu espaço de moradia, sem que, com isso, perca-se de vista um olhar crítico e propositivo sobre a sua realidade.
Assim, são mobilizadas parcerias tanto com organizações da sociedade civil e/ou coletivos – que atuam em comunidades populares, como instâncias de difusão, comunicação e realização de redes colaborativas de formação e produção – quanto com artistas, comerciantes e outros sujeitos que desenvolvem ações em diferentes campos.
A relação com a comunidade é percebida como não restrita apenas à Maré, mas junto a diversas outras favelas e espaços populares da região metropolitana do Rio de Janeiro. Desse modo, a publicidade afirmativa vem se efetivando, a partir de nossas ações e experiências pedagógicas, como uma linguagem potencial para o desenvolvimento territorial desses espaços, contribuindo para a produção de novos significados e novos lugares não somente para jovens, mas para os demais moradores de origem popular da região metropolitana do Rio de Janeiro.
O panorama cultural brasileiro vem passando por diversas mudanças em suas políticas, fato que tem gerado intensas discussões em todos os níveis da sociedade, desde os mais populares até os ambientes mais institucionalizados. De que maneira as ações do Observatório são influenciadas por esse momento?
Infelizmente, a conjuntura nacional afeta diretamente as ações e iniciativas desenvolvidas pelo Observatório de Favelas. Conforme vimos nas respostas anteriores, o diálogo e a parceria com o Estado e o poder público de modo mais amplo é uma das premissas metodológicas do trabalho desenvolvido pela organização. Além disso, o campo da cultura é um eixo fundamental e marco estratégico crucial para nossas ações e proposições, na medida em que tem uma relevância inquestionável no processo de ressignificação de favelas e espaços populares, a fim de que sejam efetivamente vistos em sua potência e em seu caráter inventivo, de modo a criar efeitos positivos em outros campos de intervenção política.
Dessa forma, a maneira como as políticas culturais de modo geral vêm sendo tratadas, relegadas a segundo plano – retrocedendo todo um trabalho de décadas, que vinha alcançando sucesso e se consolidando cada vez mais como um caminho possível, potente, efetivo e estratégico de desenvolvimento social e econômico e de afirmação e ampliação de direitos dentro do panorama político brasileiro –, nos atinge em cheio.
Todavia, apesar do horizonte conturbado e incerto, acreditamos poder avançar ainda na consolidação e na expansão de uma rede de parceiros contundente, capaz de sustentar nossas propostas de trabalho e continuar lutando pela redução das desigualdades, apostando nas iniciativas culturais como um fator estratégico crucial nesse processo.
Seminário de Organização e Planejamento do Observatório de Favelas (Foto: Bruno Thomassin).jpg