selecionado: Ariane Stolfi, Bruno Schiavo, Daniel Scandurra, Gabriel Kerhart e João Reynaldo Foi na Balada Literária de 2010 que cinco...
Publicado em 19/01/2015
Atualizado às 21:04 de 02/08/2018
obra: Código Revista
selecionado: Ariane Stolfi, Bruno Schiavo, Daniel Scandurra, Gabriel Kerhart e João Reynaldo
Foi na Balada Literária de 2010 que cinco jovens – Ariane Stolfi, Bruno Schiavo, Daniel Scandurra, Gabriel Kerhart e João Reynaldo – se encontraram e perceberam afinidades que os levariam a um projeto em comum: a veiculação on-line da revista Código, editada entre 1974 e 1990 por Erthos Albino de Souza.
Ao receber exemplares da publicação das mãos do próprio Augusto de Campos, Daniel Scandurra sabia que estava diante de um acervo raro e importante. Precisava fazer algo a respeito. “Eu fiquei com esse compromisso de, no mínimo, dividir entre os amigos”, destaca. E foi exatamente o que ele fez. Conversando e discutindo ideias, os cinco chegaram à proposta selecionada pelo Rumos.
Conscientes da relevância cultural e histórica da Código, Ariane, Bruno, Daniel, Gabriel e João não queriam apenas se limitar a digitalizar os 12 números existentes e disponibilizá-los na internet. Era preciso fazer mais.
Além das páginas da revista em PDF, o trabalho do grupo propõe uma nova maneira de ler o material – mais interativa e menos contemplativa. O objetivo é criar uma narrativa hipertextual crítica e criativa que possa servir de protótipo para publicações futuras.
Ariane comenta que o projeto é mais do que uma transposição do meio impresso para o meio digital. Usando um termo comum aos poetas concretos, ela diz que o trabalho é uma “transcriação”. Ariane destaca, ainda, que o trabalho se apropria, de certa forma, da antropofagia dos modernistas. “Digitalizar uma revista que já foi finalizada e impressa também é um processo de antropofagia”, sublinha.
Uma das ideias do projeto é que o visitante do site consiga navegar por diferentes conteúdos relacionados à revista. Depois de ler “Poeminha Poemeto Poemeu Poesseu Poessua da Flor” – de Décio Pignatari, publicado na Código 4 –, será possível, por exemplo, acessar um link para a versão musicada do poema que Péricles Cavalcanti fez no CD Sobre as Ondas, de 1995.
Para o grupo, o trabalho proposto é também uma forma de valorizar a obra e o reconhecimento de Erthos Albino de Souza, criador da revista. Além de editar e, em muitos momentos, manter a Código com recursos próprios, ele foi um dos principais articuladores do uso do computador na poesia visual.
Autêntica, independente e avançada graficamente, a Código reuniu entre seus colaboradores, além de Augusto de Campos e de Décio Pignatari, outros artistas interdisciplinares, como Antônio Risério, Caetano Veloso, Julio Plaza e Paulo Leminski.
Grupo
Embora tenham formações distintas, Ariane, Bruno, Daniel, Gabriel e João possuem em comum uma atuação interdisciplinar que mistura produções visuais, música e literatura.
Daniel Scandurra, por exemplo, teve o primeiro contato com Augusto de Campos por meio da música. Ele pesquisava a obra de John Cage, pioneiro da música eletroacústica, quando chegou ao poeta concretista – Campos é o responsável pela revisão da tradução de Rogério Duprat do livro De Segunda a um Ano, de Cage.
Mas foi apenas na Biblioteca Alceu Amoroso Lima, durante a Balada Literária de 2010 – mesmo local em que conheceu os outros integrantes do grupo –, que Daniel encontrou o autor de “Viva Vaia” pessoalmente. A partir daí, ele e os demais integrantes do grupo iniciaram uma série de projetos, que resultam agora na digitalização da Código.
Uma das poesias que serviram de forma de aproximação entre os membros do grupo foi lançada pela revista. É “Interessere”, de Décio Pignatari.
Interessere
Na vida interessa o que não é vida
Na morte interessa o que não é morte
Na arte interessa o que não é arte
Na ciência interessa o que não é ciência
Na prosa interessa o que não é prosa
Na poesia interessa o que não é poesia
Na pedra interessa o que não é pedra
No corpo interessa o que não é corpo
Na alma interessa o que não é alma
Na história interessa o que não é história
Na natureza interessa o que não é natureza
No sexo interessa o que não é sexo
(: o amor que de resto, pode ser abominável)
No homem interessa o que não é homem
Na mulher interessa o que não é mulher
No animal interessa o que não é animal
Na arquitetura interessa o que não é arquitetura
Na flor interessa o que não é flor
Em Joyce interessa o que não é Joyce
No concretismo interessa o que não é concretismo
No paradigma interessa o que não é paradigma
No sintagma interessa o que não é sintagma
Na política interessa o que não é política
Em tudo interessa o que não é tudo
No signo interessa o que não é signo
Em nada interessa o que não é nada
Interessere.
(Décio Pignatari, 1976)