Com o projeto TransAmazona, as cineastas Beatriz Morbach, Letícia Werneck e Débora Mcdowell tentam evidenciar o invisibilizado universo...
Publicado em 20/07/2017
Atualizado às 10:42 de 03/08/2018
Por Julia Alves
Com o projeto TransAmazona, as cineastas Beatriz Morbach, Letícia Werneck e Débora Mcdowell tentam evidenciar o invisibilizado universo das mulheres transexuais e travestis que vivem em áreas de influência da BR-230 – ou Rodovia Transamazônica. Contemplada pelo programa Rumos Itaú Cultural, a iniciativa propõe a realização de um road movie experimental codirigido por essas personagens até então invisíveis – que a equipe do trabalho pretende localizar ao longo de um período de dez semanas entre o Pará e o Amazonas.
[caption id="attachment_99034" align="aligncenter" width="507"] Codiretora do filme, Letícia Werneck também é fundadora da parada LGBT de Marabá, no Pará | foto: André Morbach[/caption]
Mais de 40 anos depois de sua inauguração, a rodovia que atravessa os estados brasileiros da Paraíba, do Ceará, do Piauí, do Maranhão, de Tocantins, do Pará e do Amazonas e corta a maior floresta tropical do mundo de leste a oeste continua marcada pelo ideal nacionalista de Emílio Garrastazu Médici: “integrar para não entregar”. Impactadas pela violência decorrente da extração ilegal de madeira e ouro, pelo desmatamento e pela condição de vulnerabilidade de quem reside às margens da BR-230, essas transexuais e travestis serão convidadas para “produzir narrativas próprias, dialogando com seus cotidianos de um modo favorável a uma reinvenção de suas histórias, das maneiras de contá-las e performá-las”, conta Beatriz.
O filme será construído a partir de ações educativas no campo do audiovisual voltadas para o público LGBT. “Vamos ministrar duas oficinas gratuitas, uma em Marabá [PA] e outra em Lábrea [AM], com o objetivo de produzir dois curtas-metragens idealizados pelos participantes com base em debates sobre autorrepresentação e comunicação de empoderamento, além de promover a exibição de filmes sobre a questão trans ou com pessoas trans”. Beatriz diz também que outras(os) codiretoras(es) podem aparecer no trajeto, em encontros furtivos e conversas de beira de estrada, enquanto o filme estiver sendo rodado.
[caption id="attachment_99035" align="aligncenter" width="507"] Registro feito no bairro Invasão do Padre, em Altamira, Pará, antes de a área ser inundada em decorrência das obras da usina hidrelétrica de Belo Monte | foto: Brunno Regis[/caption]
No texto de apresentação do projeto, as idealizadoras citam algumas das pautas específicas levantadas pela população trans da região amazônica, que recebe pouca ou nenhuma atenção do resto do país: “A crítica maior de ativistas LGBT da Amazônia relaciona-se à invisibilidade de suas demandas frente ao movimento LGBT do centro-sul, predominantemente branco e urbano. Questões emblemáticas, como a cadeia de prostituição de travestis indígenas, não ecoam nos grandes eventos nacionais, muito menos ocupam espaço na comunidade acadêmica tradicional. Nas zonas interioranas, os crimes motivados pela transfobia jamais chegam ao Judiciário ou repercutem na grande mídia, que perpetua a exclusão das pessoas trans, representadas como doentes criminosas, ridículas, exóticas”.
O carro comprado para a viagem será doado a um projeto realizado em parceria com a ativista trans belenense Renata Taylor – fundadora do Grupo de Resistência de Trans e Travestis da Amazônia (Gretta) e consultora do TransAmozona –, que pretende criar em Belém um espaço de acolhimento temporário para pessoas trans e travestis em situação de vulnerabilidade, oferecendo assessorias psicológica e jurídica ao público-alvo e ações educativas, além de itens básicos de alimentação, vestuário e higiene.
O filme só começa a ser rodado após a realização das oficinas e tem previsão de lançamento para 2018.