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Forma ou estrutura?, a compleição do racismo brasileiro

Nesta edição da coluna, Rosane Borges fala da entrevista de Muniz Sodré para a “Folha de S.Paulo” e de sua importância para o debate sobre o racismo brasileiro

Publicado em 31/03/2023

Atualizado às 08:37 de 10/05/2023

Por Rosane Borges

Recentemente, o comunicólogo e filósofo Muniz Sodré deu uma entrevista à Folha de S.Paulo baseada em seu mais novo livro – O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional, publicado pela Editora Vozes –, na qual ele renova o painel das discussões sobre o perfil do racismo brasileiro. Na entrevista, que se espalhou tal qual incêndio florestal, Sodré põe em cena uma questão tão antiga quanto polêmica: qual é a configuração do racismo brasileiro? De qual feitio ele é? Como podemos tipificá-lo de maneira mais apropriada?

Capa do livro O Fascismo da cor, de Muniz Sodré. Na imagem, um padrão de linhas horizontais em diferentes tons de cores terrosas é sobreposto por um quadrilátero preto, onde está escrito o nome do autor em branco, o título da obra em amarelo, e o subtítulo Uma radiografia do racismo nacional na cor branca.
Reprodução da capa do livro O Fascismo da Cor, de Muniz Sodré (imagem: Editora Vozes/divulgação)

Pontilhando um longo percurso, já traçado por vários teóricos e ativistas que se debruçaram sobre esse assunto nas últimas décadas, Sodré coloca em perspectiva um prisma que levou a intelligentsia negra brasileira, a ativistas e a pesquisadores a reposicionar a discussão. Senão vejamos.

O professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) parte de uma nova lente reflexiva, como ele mesmo diz, para dizer que o racismo no Brasil não entra nos liames do estrutural, mas se constitui em uma forma social que “contorna a dimensão societária”. De acordo com Sodré: “Esse é o caminho que leva à compreensão de como uma sociedade politicamente democrática pode conviver com formas de vida protofascistas. Assim, a forma social pode ser historicamente assimétrica à modernidade das formas de produção vigentes, desde que não existam condições culturais nem educacionais para a simetria”. 

Comparando o racismo brasileiro com o estadunidense, Sodré sustenta ao longo do livro que o racismo no pós-abolição se exerceu de forma sistemática, “mas sem a legitimidade outorgada pela unidade de um sistema ou estrutura de descriminação, baseado no imaginário da raça”, indo na contramão de uma posição que se tornou homogênea em alguns estratos acadêmicos e no conjunto do movimento negro brasileiro. 

Antes de estabelecer um “Fla x Flu” entre forma e estrutura ou entre dois autores (Muniz Sodré e Silvio Almeida, que se notabilizou com o livro Racismo estrutural), é recomendável que a polêmica trazida no mais novo livro de Sodré seja acompanhada de um espírito reflexivo disposto a abrir a caixa de ferramentas sodrenianas para saber quais peças ele adota e como as adota. Aliás, pensar e compreender são dois termos-chave na sociologia compreensiva do pensador e já funcionam como uma pista para chegarmos ao seu ferramental.

Não se trata de nos perfilarmos de um lado ou de outro (estrutural ou das formas), mas de verificarmos em que medida a nova lente reflexiva de Muniz Sodré nos oferece elementos que funcionam para o pensar melhor, bem ao modo foucaultiano, e em que medida esses elementos propiciam ou dificultam o combate ao racismo do ponto de vista institucional e político. 

Adianto que minhas leituras me autorizam a não concordar, de maneira respeitosa, com a forma com que Sodré maneja sua caixa de ferramentas para chegar às suas conclusões. Independentemente disso, ele consegue pôr em circulação uma discussão que mobiliza posições de altíssimo nível, que foram secundarizadas na lógica estridente dos algoritmos. Não tenhamos dúvidas de que estamos diante de um belo debate!

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