Para celebrar a memória do pai, a jornalista Helena Lara Resende lança documentário sobre o escritor mineiro
Publicado em 01/05/2022
Atualizado às 16:44 de 29/04/2022
por André Bernardo
Em 1947, Otto Lara Resende (1922-1992) passou a ter o que Paulo Mendes Campos (1922-1991) chamou de “pavor aéreo”. Campos chegou a dedicar ao amigo uma crônica, “Medo de avião”, publicada na revista Manchete de 11 de abril de 1964 e disponível no Portal da Crônica Brasileira. Tudo começou quando um grupo de jornalistas, entre eles Otto Lara Resende e Paulo Mendes Campos, foi convidado a cobrir um eclipse do Sol em Bocaiuva, cidade a 369 quilômetros de Belo Horizonte (MG). Lá pelas tantas, o piloto do C-47 que transportava a imprensa fez uma manobra arriscada para evitar uma colisão com uma aeronave da Panair: desligou os motores e arremeteu a 400 metros do chão. Por pouco, muito pouco mesmo, a viagem não terminou em tragédia e ganhou as manchetes dos jornais. “Otto chegou a Belo Horizonte bastante ferido”, relatou o jornalista Benício Medeiros (1947-2019) na biografia A poeira da glória (1998), da série Perfis do Rio. “Levou 22 pontos na cabeça.”
Daquele dia em diante, sempre que precisava voar, Otto Lara Resende fazia cópias de “Morte no avião”, de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e as distribuía entre os passageiros que conhecia. Incluído no livro A rosa do povo (1945), o poema descreve o último dia de vida de um homem: acorda, faz a barba, toma banho, calça os sapatos, vai ao banco, passa no escritório, almoça peixe, compra o jornal, toma um táxi, segue para o aeroporto, pega um avião e... “Caio verticalmente e me transformo em notícia”. Certa vez, durante um voo entre o Rio e Belo Horizonte, a bordo de um DC-3 da Panair, um dos amigos contemplados com os versos de Drummond foi Juscelino Kubitschek (1902-1976). “Não achei graça nenhuma, Otto!”, reclamou o então deputado federal e futuro presidente da República.
O bom humor era um traço marcante da personalidade de Otto Lara Resende. Quando não queria conversar com ninguém ao telefone, simplesmente respondia: “Acabei de sair!”. Certa noite, quem estava do outro lado da linha era o dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980). “Otto? É da casa do Otto?”, perguntou. “Não estou”, respondeu. “Mas, Otto, aqui é o Nelson!”, insistiu. “Ah, então estou!” E conversaram por horas. “Meu humour me ajuda a viver”, explicou Otto em depoimento autobiográfico concedido a Paulo Mendes Campos em 1o de abril de 1975. “Sempre fui assim, meio gaiato.” Dono de uma alma “amolecada”, fazia graça até do próprio nome, um palíndromo. “Otto Lara Resende é a prova viva de que gaiatice e erudição combinam muito bem”, destaca o jornalista Victor Calcagno, que dedicou ao escritor mineiro seu trabalho de conclusão de curso na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO/UFRJ). “É surpreendente como um autor que chegou à Academia Brasileira de Letras [ABL] é mais lembrado pelo senso de humor do que pela sua obra.”
“Entrei no jornalismo como cachorro na igreja: achei a porta aberta”
Mineiro de São João del Rei, Otto Oliveira de Lara Resende nasceu no dia 1o de maio de 1922, às 4 da manhã, na casa número 9 da Rua do Matola. Seus pais, Antônio de Lara Resende e Maria Julieta de Oliveira, tiveram 20 filhos. Desses, seis morreram antes de completar 2 anos. Na infância, Otto fez o primário e o ginásio no Instituto Padre Machado. Dos 11 aos 20 anos, teve um diário em que registrava, entre outras confidências, seu dia a dia no colégio religioso fundado pelo pai. Numa de suas idas a Belo Horizonte, conheceu Fernando Tavares Sabino (1923-2004). Com um sorriso maroto, “Nandinho”, como era conhecido, convidou o forasteiro a entrar numa loja. “Não atendeu ao convite”, observa Medeiros. “Se atendesse, levaria um tremendo choque elétrico.” Na adolescência, Otto arriscou alguns poemas, mas nunca publicou um livro desse gênero. A coletânea Poemas necessários continua inédita. Em 1981, ao ser indagado pela escritora Edla van Steen (1936-2018) se continuava escrevendo poesia, respondeu: “Nunca mais. Curei-me”.
Em 1938, a família Lara Resende se transferiu para Belo Horizonte. Na capital mineira, Otto deu início, com apenas 16 anos, à carreira jornalística. Em parceria com o inseparável Paulo Mendes Campos, escreveu uma série de artigos para o suplemento literário do jornal O diário. A dupla assinava ora como Otto Mendes, ora como Paulo Lara. Em dezembro de 1941, Otto publicou dois artigos sobre a estreia literária de Fernando Sabino, Os grilos não cantam mais. “Entrei no jornalismo exatamente como cachorro na igreja: porque achei a porta aberta”, explicou, em 1975.
“Como pai, me considero, modéstia à parte, uma mãe exemplar”
Em janeiro de 1946, Otto Lara Resende se mudou para o Rio. Tinha 23 anos. Na então capital federal, morou numa pensão na esquina da Avenida Atlântica com a Constante Ramos, no Posto 4 de Copacabana. Desde sua chegada ao Rio, em 1946, até seu ingresso na revista Manchete, em 1955, passou pela redação de cinco jornais: Diário de notícias, O globo, Diário carioca, Correio da manhã e Última hora. “Fazia de tudo. Trabalhava pra burro”, confessa no artigo “Quem é OLR?”. Sem vínculo empregatício, chegou a escrever para três jornais ao mesmo tempo. “Lembro-me dele em frente à máquina de escrever. Muitas vezes, trabalhava à noite e de madrugada, lendo e escrevendo”, recorda a jornalista Helena Lara Resende, sua filha. “Ele sempre brincava dizendo que só não era uma besta por causa da insônia.” Se Otto trabalhou em várias redações, também morou em diversos endereços: numa ocasião, dividiu apartamento com o escritor Murilo Rubião (1916-1991); noutra, com o político Juscelino Kubitschek.
Naquele mesmo ano, 1946, Otto começou a namorar Helena Uchôa Pinheiro, que conheceu numa festa de Réveillon em Belo Horizonte. Os dois se casaram em 14 de abril de 1950, na igreja do Mosteiro de São Bento, no Rio de Janeiro. “O Otto casou com o terno do Millôr”, confessa a viúva, Helena Pinheiro Lara Resende. Faltando uma semana para o casório, o humorista Millôr Fernandes (1923-2012) entregava, todo santo dia, um desenho por debaixo da porta do apartamento 201 da Rua Artur Araripe, 63, na Gávea, onde morava o noivo. “Fuja enquanto é tempo!”, dizia um. “Pense bem, amigo, faltam só seis dias”, aconselhava outro. O casal teve quatro filhos: André (1951), Bruno (1952), Cristiana (1955) e Helena (1968). “Como pai, me considero, modéstia à parte, uma mãe exemplar”, gabava-se.
Um ano depois de casado, OLR assumiu o cargo de redator do recém-fundado Última hora. Entre outros temas, produzia uma coluna de cinema, sob o pseudônimo de J.O. Não foi a primeira vez. Em 1949, assinou a seção “Correio literário”, do Jornal das letras, como Joaquim Leonel, em homenagem a um tio-avô. Em 1952, publicou seu primeiro livro, O lado humano, de contos. “Que ninguém deixe de ler esse pequeno livro de contos, nove ao todo, alguns cruéis, sórdidos mesmo, mas dessa crueza tão da vida humana”, recomendou o poeta Vinicius de Moraes (1913-1980). “A gente nunca sabe se ele gosta completamente de seus personagens ou se, embora se comovendo com eles, também os despreza um pouco”, observou a escritora Rachel de Queiroz (1910-2003) na revista O cruzeiro de 15 de agosto de 1953. Em julho de 1954, Otto assumiu a direção da revista Manchete, cargo que ocupou até 1956 e no qual conheceu, entre outros nomes, o então repórter esportivo Arnaldo Niskier, em 1955. “Graças ao seu espírito de liderança, a revista Manchete chegou a vender 300 mil exemplares por mês. Não ultrapassou a revista O cruzeiro, que vendia algo em torno de 500 mil exemplares, mas chegou perto”, recorda o acadêmico Niskier. “Depois, o destino nos separou. Nos reencontramos, para um convívio mais de perto, na Academia Brasileira de Letras, onde entrei em 1984.”
“Fui xingado até em sermão”
Apenas cinco anos depois de O lado humano, Otto lançou seu segundo livro, Boca do inferno (1957), também de contos. A obra recebeu críticas ferozes. Um dos que mais pegaram pesado foi Wilson Martins (1921-2010). “Otto Lara Resende não tem imaginação suficiente nem para criar situações excepcionais”, disparou. “Quanto ao estilo, raia a banalidade.” Rubem Braga (1913-1990) saiu em defesa do amigo: “Acho o Otto um dos melhores contistas do Brasil, embora não goste de ler muito os seus contos, porque são tristes”. Não parou por aí. Otto levou bronca do pai, sofreu ataque em sermão e recebeu carta anônima. Por fim, teve a porta de casa coberta de fezes. “Nunca mais reeditei. Nunca mais li. Tentei uma vez, mas não consegui passar das primeiras páginas”, confessou em entrevista ao Jornal da tarde de 31 de janeiro de 1976. O escritor recebeu vários convites para republicá-lo, mas nunca aceitou. Em 1998, a família autorizou a reedição. “Curioso, e triste, é que Boca do inferno me parece ter sido um livro à frente de seu tempo”, analisa o economista André Lara Resende. “A maldade humana, sobretudo na criança, ainda era um tabu quando o livro foi publicado, nos anos 1950. Hoje, num mundo distópico, menos ingênuo, teria sido recebido de outra forma.”
Em abril de 1957, a convite do Itamaraty, Otto Lara Resende seguiu para Bruxelas, onde trabalhou como adido cultural. “Adido e mal pago”, gostava de dizer. Na Bélgica, recebeu a visita de Manuel Bandeira (1886-1968). Seu primogênito, André, então com 9 anos, cismou que o visitante não era poeta. Para convencê-lo, Bandeira improvisou uns versinhos: “André, André, André / O Bandeira o que é? / É poeta ou não é? / André, André, André, / E você o que é? / É André ou Tomé, / Homem de pouca fé?”. Foram duas experiências: na Bélgica (1957-1959) e em Portugal (1967-1969). À época, Otto chegou a dar aula na Universidade de Utrecht, na Holanda.
“Sei alguns minutos de muitos assuntos. E não sei de nada”
Em 1962, OLR publicou O retrato na gaveta, de contos. Na mesma época, estreou Bonitinha mas ordinária ou Otto Lara Resende, de Nelson Rodrigues, no Rio. O título desagradou Otto, que se recusou a assistir à peça, a qual ficou cinco meses em cartaz no Teatro Maison de France. “Com o Nelson, só a tiro!”, vociferou. Os dois se conheceram pouco depois da chegada de Otto ao Rio e trabalharam juntos nos jornais O globo e Última hora. “A grande obra de OLR é a conversa”, elogiou Nelson. “Deviam pôr um taquígrafo atrás dele e vender suas anotações em uma loja de frases.” Algumas dessas tiradas, aliás, ficaram famosas: “Abraço e punhalada a gente só dá em quem está perto”, “Ultimamente, passaram-se muitos anos” e “Texto de jornal é como estação de trem: depois que o trem passa, deixou de ter interesse”. Curiosamente, sempre renegou a autoria de “O mineiro só é solidário no câncer”, atribuída a ele por Nelson.
Em 1965, o conto “A cilada” foi incluído na antologia Os sete pecados capitais, organizada pelo editor Ênio Silveira (1925-1996) para a Editora Civilização Brasileira. Entre outros autores, Otto escreveu sobre avareza, Carlos Heitor Cony (1926-2018) sobre luxúria e Guimarães Rosa (1908-1967) sobre soberba. Cada um recebeu, pela encomenda, a quantia de 200 cruzeiros. “Para fazer luxúria, até que vale a pena. Para fazer soberba, é pouco. Para fazer avareza, ridículo”, improvisou Otto, à boca do caixa, para espanto de Cony. No mesmo ano, Otto começou a trabalhar no Jornal do Brasil, onde permaneceu até dezembro de 1973.
“É bom ser conhecido. O chato é ser reconhecido”
Em novembro de 1966, passou a apresentar, ao vivo, “O pequeno mundo do Otto Lara Resende”, quadro do Jornal de verdade, telejornal da TV Globo. Saía de noite do JB, no Centro, e seguia para a sede da emissora, no Jardim Botânico. Certa vez, foi abordado na rua por uma telespectadora. “Você não é o... o… Nelson Rodrigues?”, quis saber. “É bom ser conhecido. O chato é ser reconhecido”, desabafou à época. Entre outras funções, assumiu o papel de ghost-writer de Roberto Marinho (1904-2003). No dia 28 de maio de 1977, OLR redigiu tanto o pedido de demissão de Walter Clark (1936-1997) quanto a carta de Roberto Marinho aceitando a demissão do diretor-geral da emissora.
Em 3 de julho de 1979, Otto Lara Resende ingressou na ABL. Assumiu a cadeira 39, que pertencera ao jornalista Elmano Cardim (1891-1979). Disputou a vaga com o sociólogo Djacir Menezes (1907-1996) e ganhou por 24 votos a 13. “Tenho horror à competição. Talvez, certamente, porque tenho medo de perder”, confessou. Detalhe: quando Otto morreu, em 1992, quem assumiu sua vaga foi Roberto Marinho.
Em 1o de maio de 1991, no dia do seu 69o aniversário, Otto estreou uma coluna diária no jornal Folha de S. Paulo. O título de sua primeira crônica era “Bom dia para nascer”. Durante o almoço com o jornalista Matinas Suzuki Jr. em um restaurante no Jardim Botânico, para acertar os detalhes de sua contratação, Otto perguntou se a Folha pretendia exigir exclusividade. “Bem, a gente gostaria, mas exigir não vamos”, respondeu o jornalista. “Pois eu gostaria que exigissem!”, afirmou, com seu habitual bom humor. A parceria durou um ano e sete meses e se encerrou em 21 de dezembro de 1992, com a crônica “Águia na cabeça”, publicada uma semana antes de sua morte. Foram, ao todo, 508 crônicas. Dessas, 266 integram a coletânea Bom dia para nascer (2011), organizada por Humberto Werneck.
“A morte é noturna. À noite, todos os doentes agonizam”
Otto Lara Resende morreu na madrugada de 28 de dezembro de 1992, em decorrência de complicações de uma cirurgia de hérnia de disco, realizada 19 dias antes no Hospital da Beneficência Portuguesa, na Glória, Zona Sul do Rio. “Muitos atribuem a hérnia de disco com que se viu obrigado a conviver no final da vida à tensão de escrever todo dia, somada à ansiedade de fazer sempre o melhor possível”, especula Benício Medeiros em A poeira da glória.
Ao longo da carreira, OLR lançou um romance, O braço direito (1963), e quatro livros de contos: O lado humano (1952), Boca do inferno (1957), O retrato na gaveta (1962) e As pompas do mundo (1975). “É um escritor que, frase a frase, vai nos arrastando pelo colarinho. Seu texto é sempre forte e original, ao mesmo tempo agudo e elegante. Não há nada datado em sua ficção”, enaltece o escritor Cristovão Tezza, autor do posfácio de A testemunha silenciosa (1995). “O conjunto de sua obra literária é suficientemente forte e marcante para permanecer e ser relembrada, tanto pelo estudioso da história literária brasileira quanto pelo leitor comum. É sempre um prazer ler Otto Lara Resende.”
Depois de sua morte, mais três títulos foram lançados: Bom dia para nascer (1993), de crônicas; O príncipe e o sabiá (1994), de perfis; e O Rio é tão longe (2011), de cartas. “O reconhecimento de sua obra é ainda muito menor do que merece. E as razões são muitas”, acredita André Lara Resende. “O homem Otto Lara Resende era uma figura sociável, com extraordinária presença de espírito e grande senso de humor. Mas a sua literatura era soturna, quase sempre um mergulho pouco agradável nos porões da alma humana.” Ainda neste ano, a Companhia das Letras pretende lançar novas edições de O braço direito, com posfácio da escritora Ana Miranda, e O lado humano, com posfácio de Clara Alvim.
“Escrever é de amargar”
Como escritor, OLR era, para dizer o mínimo, perfeccionista. Um bom exemplo disso é O braço direito. Seu primeiro e único romance foi reescrito cinco vezes. A cada nova versão, reescrevia parágrafos inteiros e acrescentava novos elementos. Chegou a contar com a ajuda de Ana Miranda na revisão dos originais. “Basta pegar duas edições diferentes dessa obra e se veem facilmente as inúmeras alterações que fez”, analisa Elvia Bezerra, ex-coordenadora de literatura do Instituto Moreira Salles (IMS), que cuida do acervo do autor desde 1994. “Algoz de si mesmo, era permanentemente insatisfeito com o que fazia.” André Lara Resende aponta outras características: “Era indisciplinado no seu cotidiano, na falta de horário para se dedicar à literatura, mas profundamente metódico em relação aos seus trabalhos. Estava sempre a rever e reescrever seus textos”, sublinha. “Aprendi com meu pai a me esforçar para escrever de forma clara, concisa e inteligível, o que dá muito trabalho para, ao fim, parecer que se escreveu sem esforço.”
Seu acervo no IMS é composto de 8.300 cartas, 7 mil livros, 2.100 fotografias, 1.800 documentos e 54 desenhos de artistas, como Millôr, Ziraldo e Borjalo (1925-2004), entre outros itens. Em 2002, a instituição lançou Três Ottos por Otto Lara Resende, organizado por Tatiana Longo dos Santos. “De simpatia idiossincrática é a sua coleção de dedicatórias em folhas arrancadas de publicações, prática que surgiu com o hábito de doar livros a bibliotecas públicas sem querer desfazer-se, entretanto, da página em que o autor lhe oferecera a obra”, destaca a doutora em literatura brasileira pela Universidade de São Paulo (USP). “Livros doados, mas companheirismo preservado.”
Para 2023, o IMS planeja lançar um volume dedicado à correspondência entre Otto Lara Resende e Dalton Trevisan. Os dois se conheceram em 1955, na casa de Fernando Sabino, no Rio. Em 2002, o “Vampiro de Curitiba” confiou ao IMS as quase 600 cartas que trocou com o escritor mineiro entre 1956 e 1992. “Não havia perigo de Dalton Trevisan publicar um conto sem submetê-lo à leitura do amigo, que opinava com toda a franqueza e, no caso, admiração”, relata a pesquisadora Elvia Bezerra. “Além do contato epistolar, Dalton costumava vir ao Rio para tratar de questões editoriais e, durante essas visitas, não saía de perto de Otto, que o recebia em seu apartamento de quarto e sala onde montou seu escritório na Rua Piratininga, ou em sua casa, também na Gávea, para longuíssimos almoços ou jantares.”
O centenário de Otto Lara Resende, um dos “quatro cavaleiros de um íntimo apocalipse”, ao lado de Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino e Hélio Pellegrino (1924-1988), não vai passar em branco. Além dos lançamentos previstos pela Companhia das Letras e pelo Instituto Moreira Salles, Helena Lara Resende deseja homenagear o pai com o documentário Otto – de trás para diante, que deve chegar às telas ainda no primeiro semestre. Escrito e dirigido em parceria com Marcos Ribeiro, conta com a participação da atriz Júlia Lemmertz, do ator Rodolfo Vaz e do crítico Humberto Werneck. Entre outros achados, Helena revela alguns dos bilhetes que trocou com o pai, a quem chamava de “Velho Careca”. “Passei muito tempo sem conseguir ler as cartas e os bilhetes deixados pelo meu pai. Era difícil, pois a morte dele foi muito rápida e inesperada”, recorda Helena, que tinha 24 anos quando o pai morreu. “A minha lembrança nunca será do escritor, e sim do pai presente e amoroso. Não há um dia em que eu não pense nele.”