Projeto selecionado pelo “Rumos Itaú Cultural” possibilitou a jovens a criação e manutenção de arquivos independentes e coleções especiais
Publicado em 15/03/2022
Atualizado às 12:23 de 15/03/2022
por Ana Luiza Aguiar
“Se minha avó de 80 anos – que é empregada doméstica, filha e neta de empregadas domésticas – conversasse com uma senhora negra de 80 anos nascida em Salvador, sobre o que elas falariam?” Essa pergunta é a premissa do trabalho do antropólogo estadunidense Sed Miles. E, para registrar o que ele batizou de diálogo que “vem de baixo”, criou a fundação Atlantic Archives, que busca documentar o dia a dia das populações negras do Brasil e dos Estados Unidos, registrando histórias e artefatos para contar como seria esse diálogo imaginário.
Miles define o Atlantic Archives como uma organização comunitária transnacional que apoia grupos historicamente marginalizados no Brasil e nos Estados Unidos por meio da partilha e da preservação de suas histórias. Já tendo coletado registros em Nova Orleans, Bennettsville e Nova York, o antropólogo buscou o apoio do Itaú Cultural (IC) para criar uma comunidade que pudesse realizar a coleta no Brasil. Seu projeto Mochileiros arquivistas foi um dos aprovados no edital 2019-2020 do programa Rumos.
No auge da pandemia, a iniciativa distribuiu bolsas de estudo a jovens afro-brasileiros de comunidades vulneráveis em Salvador, na Bahia, e os capacitou para que pudessem criar e manter arquivos independentes e coleções especiais pertinentes aos grupos comunitários em que moram e atuam. Os arquivistas também receberam mochilas personalizadas com equipamento e tecnologia de arquivo para ajudar na coleta, preservação e partilha das suas histórias.
O resultado do programa de cinco meses foi um conjunto diverso de coleções comunitárias, apresentadas de forma coordenada com a coleção permanente do Atlantic Archives em uma exposição na Biblioteca Central do Estado da Bahia em janeiro de 2020. Ao todo, foram 50 obras e objetos criados e montados pelos seis bolsistas, que incluíam fotografias, pinturas, arte digital, arte sonora, cinema, meios mistos e literatura rara.
Junto com as coleções montadas pelos bolsistas do projeto Mochileiros arquivistas, a exposição apresentou em primeira mão um arquivo fotográfico recém-descoberto por Rita Conceição, arquivista veterana que trabalha há 40 anos documentando os movimentos negros, LGBTQIA+, religiosos afro e de trabalhadores na Bahia. Rita é fundadora da primeira ONG para meninas negras em Salvador, o Bahia Streets, e a primeira pessoa a receber o prêmio Sallie Mae Archivist-in-Residence, concedido pela Fundação Atlantic Archives, que viabilizou a restauração, preservação e promoção de seu arquivo.