CONTRIBUIÇÃO DE LEVI
NA MODERNIZAÇÃO DAS CIDADES
Os professores, arquitetos e cocuradores da Ocupação Rino Levi Hugo Segawa, Joana Mello, Mônica Junqueira de Camargo e Tatiana Sakurai escrevem sobre este arquiteto que atuou em todas as frentes da metropolização paulistana – da verticalização das áreas centrais, à expansão horizontal da mancha urbana por meio de bairros e a diversificação e especialização das atividades econômicas e profissionais no setor
Em 1901, quando Rino Levi nasceu, São Paulo tinha cerca de 239 mil habitantes. Vinte e cinco anos depois, em 1926, quando ele retornou ao Brasil formado pela Escola Superior de Arquitetura de Roma, a cidade já tinha mais de 580 mil habitantes, alcançando nos anos 1960 – quando o arquiteto faleceu, durante uma das habituais expedições de reconhecimento da flora brasileira que realizava com o paisagista, colaborador e amigo Roberto Burle Marx – para além de três milhões de habitantes.
Participaram desse crescimento populacional exponencial italianos, como os pais do arquiteto, mas também espanhóis, alemães, japoneses, árabes e imigrantes de outras nacionalidades, a quem se somaram brasileiros vindos de várias partes do país em busca de novas oportunidades de vida e de trabalho. Em um primeiro momento, muitos deles se vincularam à economia cafeeira, mas logo viram nas atividades a ela atreladas – como o mercado imobiliário, a indústria, o comércio e os serviços – outras possibilidades que fizeram de São Paulo uma metrópole moderna.
Rino Levi é filho desse processo para o qual contribui como arquiteto, atuando em todas as frentes da metropolização paulistana: a verticalização das áreas centrais que concentram as atividades de serviço, comércio, lazer e cultura; a expansão horizontal da mancha urbana por meio de bairros residenciais de classes sociais distintas; a diversificação e a especialização das atividades econômicas e profissionais. Um dos primeiros arquitetos a fundar um escritório exclusivamente dedicado ao projeto, Levi constrói parcerias com profissionais de várias áreas por considerar, como Walter Gropius, que o arquiteto é um “coordenador, cuja missão é unificar os inúmeros problemas sociais, técnicos, econômicos e plásticos inerentes à construção”. Entre as associações mais longevas estão as firmadas com Roberto Cerqueira Cesar e Luiz Roberto Carvalho Franco, sócios a partir de 1945 e 1955, respectivamente.
No início da carreira, entre as décadas de 1920 e 1930, a maior parte de suas encomendas foram de casas geminadas, como as projetadas para Luiz Manfro, ou de residências unifamiliares, nas quais prevalece uma organização mais formal e setorizada do morar, como a idealizada para Delfina Ferrabino.
Em meados dos anos 1930 começa a aumentar o número de encomendas de edifícios residenciais, como o Prudência, em que o arquiteto desenha uma maior integração da área social, assim como uma flexibilidade na disposição dos ambientes, cujas divisões eram realizadas por meio de mobiliário. A mesma solução é adotada em sua residência particular e nas que posteriormente realizou – como a Residência Milton Guper –, nas quais propôs também a introversão dos ambientes sociais e íntimos para dentro do lote, voltando os serviços para a rua, e a revisão da tradicional separação entre interior e exterior em favor de uma continuidade que tornasse a casa mais aberta, alegre e humana, graças à convivência com a natureza.
É a partir da segunda metade dos anos 1930 que Levi realiza projetos de cinemas e teatros, como o Ufa Palácio e Cultura Artística. Neles, enfrenta programas mais complexos que articulam usos diversos e exigem um conhecimento técnico específico, como o de acústica, mas também de fluxos, infraestrutura, conforto e higiene, como no caso de hospitais – por exemplo, o Hospital Antônio Cândido de Camargo, do Instituto Central do Câncer –, que fazem do arquiteto um especialista com alto grau de reconhecimento dentro e fora do campo profissional brasileiro e mesmo internacional.
São desse período ainda os edifícios de escritórios, nos quais Levi explora os elementos de proteção solar, investe em volumetrias mais complexas em função dos usos e da geometria dos terrenos e adota a mesma estratégia de flexibilidade das plantas, como se nota no Banco Sul-Americano do Brasil. Nele, percebe-se a atenção recorrente ao paisagismo e ao esforço de promover o contato do público com a natureza e a intenção de integrar arquitetura, pintura e escultura, promovendo uma síntese cara aos arquitetos modernos. Mesmo em programas mais técnicos ou pragmáticos, como o industrial, ou de larga escala, esse propósito de integrar arquitetura, artes e natureza não se perde, conforme observado na Tecelagem Paraíba e no Centro Cívico de Santo André.
Além da diversidade de projetos realizados, impressiona a capacidade de Rino Levi de assumir uma postura muito objetiva diante de encomendas reais, enfrentando condições urbanas e materiais específicas, além de exigências técnicas e funcionais, mas também de idealizar novas formas de organização da cidade e de suas atividades – como se vê na proposta do Edifício Garagem ou no Plano Piloto de Brasília –, e de, em qualquer um dos casos, atentar para a escala cotidiana, produzindo espaços e artefatos que deem suporte ao conjunto de ações humanas.
Dessa forma, atuando em um ambiente marcado pelo cosmopolitismo em um momento de revisão do academicismo arquitetônico vigente, Rino Levi participou ativamente da modernização da cidade no momento de sua brutal expansão e metropolização, introduzindo novos padrões espaciais, técnicos e estéticos. Com grande preocupação pelos problemas urbanos, sem adesão a uma doutrina específica e à pretensão de revolucionar os cânones teóricos, sua arquitetura é fruto da busca de soluções simples e de uma linguagem marcada pela abstração e pela ausência de decoração.
Pensando-se como um “arquiteto integral”, Rino Levi defendeu à frente de seu escritório, e também como professor e presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil, que a sua atividade profissional se estendia “desde o desenho dos objetos de utilidade imediata, ao desenho da construção, à cenografia, aos problemas de circulação, ao paisagismo e aos conjuntos comunitários, urbanos, rurais e regionais, compreendendo toda a complexidade de conhecimentos e de aspectos próprios de cada um desses setores”(*). Os projetos expostos na Ocupação e reunidos nesta publicação (produzida pelo Itaú Cultural exclusivamente para esta mostra), em infográficos, testemunham o quanto Rino Levi investigou essas várias áreas de atuação e o quanto ele ainda tem a nos ensinar.
SOBRE OS AUTORES DO TEXTO
Hugo Segawa é arquiteto e professor universitário. Professor-doutor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e autor de diversos livros e artigos sobre arquitetura brasileira e internacional. Pela editora Ateliê, publicou Prelúdio da Metrópole.
Joana Mello é docente do departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto, grupo de disciplinas Histórias e Teorias da Arquitetura. Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo na Universidade de São Paulo (FAUUSP,1997), mestrado em Arquitetura e Urbanismo pelo departamento de Arquitetura e Urbanismo da Escola de engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (2005) e doutorado em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo pela FAUUSP (2010) e pós-doutorado pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de Campinas (Unicamp, 2015). Foi redatora da Enciclopédia Itaú Cultural.
Mônica Junqueira de Camargo é arquiteta, professora associada de História da Arquitetura Moderna e Contemporânea na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo na Universidade de São Paulo (FAUUSP), desde 2002. Arquiteta da Prefeitura do Município de São Paulo (1978-2002), tendo trabalhado no Departamento do Patrimônio Histórico e na Divisão de Pesquisas – Equipe Técnica de Pesquisas em Arquitetura do Centro Cultural São Paulo. Professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie (1987-2002). Conselheira do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp, 2003-2007). Editora da Revista Pós (2010-2013). É diretora do Centro de Preservação Cultural da USP (CPC) desde 2014. Autora de livros e artigos, entre os quais: Fotografia / Cultura e fotografia paulistana no século XX, com Ricardo Mendes e Fábio Penteado: Ensaios arquitetônicos.
Tatiana Sakura é professora do departamento de Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), desde 2014. É graduada e mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo. Em 2012 conclui o doutorado no programa de Pós-Graduação pela mesma instituição. Atuou anteriormente como assistente de direção da Escola de Design do Istituto Europeo di Design (IED), professora da Faculdade de Administração e Artes de Limeira (FAAL) e na Panamericana – Escola de Arte e Design.
(*) Rino Levi, O Ensino da Arquitetura – conferência realizada na Universidade Mackenzie, a convite do Grêmio da Faculdade de Arquitetura, no dia 16 de outubro de 1956.
SERVIÇO
Ocupação Rino Levi
Abertura: sábado, dia 29 de fevereiro, às 11h
Visitação: até 12 de abril
Piso térreo
Classificação etária: livre
De terças-feiras a sextas-feiras, das 9h às 20h
(permanência até as 20h30)
Sábados, domingos e feriados, das 11h às 20h
Entrada gratuita
Realização:
Cristina R. Durán:
cristina.duran@conteudonet.com
Mariana Zoboli:
mariana.zoboli@conteudonet.com
Roberta Montanari:
roberta.montanari@conteudonet.com
Vinicius Magalhães:
vinicius.magalhaes@conteudonet.com
No Itaú Cultural:
Larissa Correa:
larissa.correa@terceiros.itaucultural.org.br
Fone: 11 2168-1950
Carina Bordalo (programa Rumos)
carina.bordalo@terceiros.itaucultural.org.br
Fone: 11 2168-1906