O modelo quântico envolve uma série de equações matemáticas capazes de antecipar com precisão resultados experimentais. Trata-se do modelo mais preciso desenvolvido pela física até os dias de hoje. De sua aplicação prática resultou, por exemplo, toda a nossa tecnologia digital. Entretanto o que essas equações matemáticas realmente representam está, na física atual, aberto a diferentes interpretações.
Tomemos como exemplo a “função de onda”, um descritor de estado no modelo quântico. De modo muito geral, uma das interpretações (a “de Copenhague”) considera que dessa função resulta a probabilidade de um evento ocorrer. Em outra interpretação (chamada “dos muitos mundos”), a função de onda resulta na probabilidade de nossa consciência estar no universo específico onde aquele evento ocorreu.
Em termos matemáticos, nada muda, essas são apenas interpretações do que a mesma função significaria. Mas visões tão diferentes têm grande impacto no que pode ser a nossa realidade: vivemos num universo onde as possibilidades quânticas são apenas virtuais e a realidade única, ou o universo que percebemos é apenas uma fração de um Multiverso muito maior, em que cada possibilidade diferente de um fenômeno quântico se realiza, de forma determinista? Como pode um mesmo modelo resultar de realidades tão diferentes, sem que ocorram inconsistências
matemáticas?
Resumindo: o modelo matemático funciona (sabe-se disso por quase um século de experiências e de aplicações práticas), mas ainda não se sabe que tipo de realidade ele descreve. Na ciência, essa talvez não seja uma questão relevante - o que importa é que o modelo funcione de acordo com resultados experimentais. Na arte, entretanto, a questão da realidade por trás do modelo pode ser de extrema importância.
Um computador quântico funciona de maneira radicalmente diferente da de um computador
digital. Tais computadores talvez não passassem de curiosidades de laboratório há poucos anos, mas seu desenvolvimento vem ocorrendo de maneira acelerada, fato comprovado tanto pela recente comercialização de máquinas da empresa canadense DWave como pelos últimos modelos experimentais da IBM. Ainda estão um tanto distantes da “máquina de Turing quântica universal”, proposta por David Deutsch (*) em 1985, mas são evidências suficientes da viabilidade desse novo modelo de computação.
Enquanto um bit digital pode conter os valores “0” ou “1”, um bit quântico (um qbit) armazena “0” e “1” simultaneamente. Dessa diferença resultam comportamentos que desafiam nosso senso comum. Uma variável composta por qbits armazena todos os valores possíveis para aquele número de qbits - e o faz simultaneamente. Uma imagem construída por qbits conteria todas as imagens possíveis para aquele número de pixels (absolutamente toda e qualquer imagem: desde ruído gráfico até fotos que ainda não foram feitas). Um arquivo quântico de texto seria algo similar à “biblioteca de Babel”, de Borges (**) (todas as combinações possíveis de texto estariam lá), porém com uma diferença importante: o espaço de armazenamento seria similar ao de um arquivo digital comum, não seria necessário uma biblioteca de dimensões infinitas, como a descrita no conto.
O processamento desses qbits também pode ser desconcertante: quando um algoritmo atua sobre uma variável quântica, o faz sobre todos os valores possíveis, simultaneamente. É difícil prever como algoritmos quânticos mudarão nosso dia a dia, mas o campo da inteligência artificial será afetado radicalmente.
Algoritmos digitais de inteligência artificial são construídos para testar um grande número de soluções numéricas e encontrar a mais apropriada segundo determinados critérios. Assim é com os algoritmos genéticos, que geram e testam um grande número de soluções possíveis, em “gerações”, para selecionar as melhores, e com o treinamento de redes neurais, que busca multiplicadores, ou “sinapses”, que minimizem o erro entre numerosos conjuntos de problemas e suas respectivas soluções.
Grande parte desses códigos digitais é dedicada a gerar possibilidades diferentes, para que possam ser sequencialmente avaliadas, uma a uma. Populações de algoritmos genéticos, por exemplo, não dão conta de todas as possibilidades - isso seria muito custoso em termos de processamento digital. De fato, parte desses algoritmos se dedica a tentar fugir dos chamados “mínimos locais”, de soluções que ficariam “presas” a certas regiões do campo de soluções exatamente por se tratar de uma amostra desse campo, não de todas as possibilidades.
Não é assim num algoritmo quântico. Cada variável quântica contém todos os valores possíveis, portanto, a busca por soluções é completa - e sem que isso acarrete limitação de processamento (os valores “já estão lá”, não é preciso gerá-los e testá-los um a um). Se na atual tecnologia digital o aprendizado de máquina já nos impressiona e, em muitos casos, se iguala, o que esperar de um futuro próximo, em que algoritmos de inteligência artificial avaliarão simultaneamente todas as opções possíveis? Quanto da realidade percebemos de fato? Ora, se a consciência humana está limitada a apenas uma dentre essas realidades diferentes, como seria uma consciência cibernética que transcenda esse horizonte estreito, operando na vastidão do Multiverso?
Marcos Cuzziol
Gerente do Núcleo de Inovação
do Itaú Cultural
(*) Deutsch, David (July 1985). Quantum theory, the Church-Turing principle and the universal quantum computer (PDF). Proceedings of the Royal Society A. 400 (1818): 97–117. Bibcode:1985RSPSA.400...97D. CiteSeerX 10.1.1.41.2382. doi:10.1098/rspa.1985.0070
(*) Borges, Jorge L. (1944) A Biblioteca de Babel in Ficções, Companhia das Letras
Consciência Cibernética [?] Horizonte Quântico
• EXPOSIÇÃO
Abertura: 27 de março, às 20h
Visitação: 28 de março a 19 de maio de 2019
Terças-feiras a sextas-feiras, das 9h às 20h
(permanência até as 20h30)
Sábados, domingos e feriados, das 11h às 20h
Pisos: 1M, 1S e 2S
Conceito: Marcos Cuzziol
Pesquisa: Rejane Cantoni
Projeto Expográfico: ST Arquitetura
Classificação indicativa: Livre
• SEMINÁRIO
28 e 29 de março 2019, Sala Itaú Cultural
Dia 28: Sala Itaú Cultural
Mesa 1 - 16h às 18h: Arte e inteligência artificial
Mesa 2- 19h às 21h: Computação quântica na vida real
Dia 29: Sala Itaú Cultural
Mesa 3 - 16h às 18h: Arte e computação quântica
Mesa 4 - 19h às 21h: Inteligência Artificial e Subjetividades
Avenida Paulista, 149, Estação Brigadeiro do Metrô
Fones: 11. 2168-1777
Acesso para pessoas com deficiência
Ar condicionado
Estacionamento: Entrada pela Rua Leôncio de Carvalho, 108
Se o visitante carimbar o tíquete na recepção do Itaú Cultural:
3 horas: R$ 7; 4 horas: R$ 9; 5 a 12 horas: R$ 10.
Com manobrista e seguro, gratuito para bicicletas.
Realização:
Cristina R. Durán: cristina.duran@conteudonet.com
Karinna Cerullo: cacau.cerullo@conteudonet.com
Mariana Zoboli: mariana.zoboli@conteudonet.com
Roberta Montanari: roberta.montanari@conteudonet.com
No Itaú Cultural:
Larissa Correa:
larissa.correa@terceiros.itaucultural.org.br
Fone: 11.2168-1950
Carina Bordalo (programa Rumos)
carina.bordalo@terceiros.itaucultural.org.br
Fone: 11.2168-1906