Boca de Rua – Vozes de uma gente invisível

de Marcelo Andriguetti

sorria é sexta-feira

de Luka Melero

gamewhat

de Fábio Alves

sinoâncias

de Carol A. Gouvêa
e André N. P. Azevedo

saltimbancos

de Camila Garcia

se eu demorar uns meses

de Giovanni Francischelli

o ponto cego

de Chico Bahia

Trans*lucidx

de Tamíris Spinelli

o centro invisível

de Tiago Pedro

osso da fala

de Sheyla Smanioto
e Raphael Picerni

Boca de rua vozes de uma
gente invisível

por Marcelo Andrigetti

Rio Grande do Sul, 2013 | 10 min

Uma conversa de bar, ao final da tarde, com amigos reunidos ao redor de uma mesa posta na calçada, quando um homem bem vestido se aproxima. Ele oferece um jornal ao preço de 1 real. E enfatiza: “com esse baixo valor, você pode ajudar os moradores de rua de Porto Alegre”. Foi assim, em uma situação informal, que surgiu a ideia de registrar o trabalho do jornal Boca de Rua, o único do país a ser inteiramente produzido e comercializado por moradores em situação de rua.

FOI O DESCONHECIDO QUE BATEU À PORTA

por Marcelo Andrigetti

Rio Grande do Sul, 2013 | 10 min

Uma conversa de bar, ao final da tarde, com amigos reunidos ao redor de uma mesa posta na calçada, quando um homem bem vestido se aproxima. Ele oferece um jornal ao preço
de 1 real. E enfatiza: “com esse baixo valor, você pode ajudar os moradores de rua de Porto Alegre”. Foi assim, em uma situação informal, que surgiu a ideia de registrar o trabalho
do jornal Boca de Rua, o único do país a ser inteiramente produzido e comercializado por moradores em situação
de rua.

De imediato a ideia chamou a atenção da equipe. Não somente pelo jornal, mas pela atitude das pessoas que o fazem. A proposta merecia um registro, já que o veículo trimestral existe desde 2001 e nunca atrasou uma edição sequer. Desde o princípio, mais de 150 pessoas passaram pelo Boca e mais de 70 deixaram de dormir nas ruas. E o mais importante é que todos eles venceram
a barreira da invisibilidade.

Por meio da publicação, os moradores de rua criaram uma ponte entre a sociedade e os “excluídos”. Passaram a utilizar as palavras para lutar contra a falta de percepção de quem não os olhava, de quem fingia que não existiam. Com o Boca de Rua, passaram a ser cidadãos. E, além disso, começaram a contribuir para a democracia do país, lutando por seus ideais e pelo crescimento das políticas direcionadas aos moradores de rua.

Começamos o documentário Boca de Rua – Vozes de uma Gente Invisível pensando em filmar tudo do ponto de vista

dos moradores. Por isso, toda a pesquisa foi feita sem a presença da câmera. Fizemos questão de levar os profissionais envolvidos com o filme para acompanhar o processo de realização do jornal, as reuniões de pauta, as discussões, as reportagens. Queríamos entender o que era aquela publicação e o que ela representava na vida de cada um. Queríamos fazer parte daquela história. Os integrantes do jornal foram unânimes em dizer: “só aceitamos participar do documentário se vocês não nos usarem como mecanismo de venda”.

Isso tudo nos chamou muito a atenção. Eles conheciam leis, tinham Facebook e até carteira de trabalho assinada. Percebemos que a distância “eles” e “nós” não existia. “Eles” eram todos “nós”. Desse modo, percebemos que tratar os moradores de rua com diferença seria o primeiro passo para nos equivocarmos no documentário. Começou dessa forma o processo de gravação e, com a pesquisa inicial, o roteiro já mostrava certo desenvolvimento. A partir daí, tendo um horizonte a perseguir, as filmagens começaram no ápice do verão de Porto Alegre.

Surgiram também os contratempos. Nenhum integrante do jornal tinha celular. Quando eles não apareciam nas entrevistas – o que aconteceu algumas vezes –, tínhamos que juntar o equipamento e ir embora. Depois de acontecimentos como esses, percebemos que a ausência deles causava um incômodo e um distanciamento que não gostaríamos que fosse transferido ao documentário. A solução foi encontrada no próprio set: decidimos gravar o >>

vazio, o silêncio, a falta, a invisibilidade.
E o desconhecido foi se tornando claro, explicativo e nos rendeu belas imagens. Um banco vazio na beira do Rio Guaíba, uma árvore seca, uma antiga estátua suja, entre outros elementos.

Feita a captação das entrevistas, passamos às reuniões de pauta do jornal, aos encontros fora de hora, às reportagens e ao processo de escrita, diagramação e finalmente impressão – que ocorre em outra cidade do Rio Grande do Sul, com o apoio de uma gráfica. Todos os momentos foram acompanhados de perto pelo Itaú Cultural, por meio de uma plataforma virtual para discussões sobre os projetos. Como realizador, foi nesse espaço onde senti que estava contribuindo para o crescimento do cinema brasileiro. Ser ouvido e participar do debate com outros diretores contemplados fez com que o nosso Boca de Rua amadurecesse, com que as ideias circulassem, transformando a teoria em método.

O Pátio [nome dado à plataforma virtual] foi interessante para verificarmos a “audiência”. Acompanhados de perto por profissionais reconhecidos no campo cinematográfico brasileiro, vivenciamos diversas vezes o exercício da crítica, ponderando e fazendo mutações em nossas maneiras de contar a história. Feita essa etapa, as discussões nos ajudaram sempre a refletir sobre qual seria o melhor
caminho a seguir.

Os debates nesse ambiente foram tomando forma e, quando nos sentamos na ilha de edição para trabalhar com as imagens brutas, a ideia guia do documentário estava montada. Ou seja: já sabíamos o que dizer com o Boca de Rua – Vozes de uma Gente Invisível. Desde o início do processo, inclusive durante o processo de seleção, queríamos um filme não convencional, que tivesse a cara da internet, que fosse baseado em novas narrativas, novas formas de contar e não simplesmente entrevistas que descrevem uma história. Criamos, a partir daí, uma linguagem rápida, dinâmica, recheada de simbolismos não aparentes (subjetivos).

Saindo da edição, encaminhamos o material para
finalização e desenho de som. As trilhas sonoras foram cedidas gentilmente por duas pessoas muito importantes no cenário musical: Dub Fx e Nazaré Vox. O primeiro deles
é um músico de rua, reconhecido internacionalmente por tocar em praças e ruas movimentadas da Austrália e por reproduzir o som de todos os instrumentos com a boca.
Para nossa surpresa, o músico assistiu à montagem e aprovou a utilização da canção “Flow”. Nazaré Vox é um músico e ator de Porto Alegre. Compõe para teatro e suas músicas estão disponíveis na internet. Por entender o mecanismo virtual e, por isso, ter relação com a divulgação do documentário Boca de Rua, acreditamos no trabalho dele e também recebemos autorização para utilizar a música instrumental “Confuse”. >>

O tratamento de cor e os grafismos nos ajudaram no desenrolar da história, servindo de elementos para a construção narrativa. As cores, que beiram a publicidade (sem perder o caráter naturalista), junto de um desenho
de som mais arrojado, nos levaram por um caminho mais limpo sonora e visualmente. O equilíbrio foi encontrado e, com a intenção de engrandecer o trabalho na web, o filme pode ser compreendido de modo integral quase que exclusivamente na internet. Ele foi planejado, desenvolvido e executado para funcionar de maneira plena no ambiente virtual: desde a escolha dos planos, da narrativa, da estética até a sua divulgação.

A intenção é viralizar o filme, divulgando-o com linguagem própria e em um canal com estética avançada no YouTube. Antes do lançamento, vamos trabalhar com pequenos trailers, de no máximo 30 segundos, que nos ajudarão nesse processo de difusão do conteúdo. Além disso, no mesmo lugar, será possível conhecer um pouco melhor a história do jornal e saber como encontrá-lo. Porém, a maior tarefa da divulgação é servir de base criativa para outros grupos tidos como “invisíveis” pela sociedade comum. Queremos ampliar o debate, levando para faculdades, cinemas e festivais, mas também para moradores de rua de outras capitais e cidades do país. Quem sabe, dessa forma, o Boca de Rua – Vozes de uma Gente Invisível mostre que existem outros caminhos a serem seguidos. Basta querer.

Sorria, é Sexta-feira

por Luka Melero

Rio de Janeiro, 2013 | 10 min

Mesmo com experiência de iniciante, já descobri que o documentário é uma obra líquida e mutável até o fechamento de sua edição. O filme Sorria, É Sexta-Feira começou com a ideia de questionar, em meio ao trânsito de uma sexta-feira, como as pessoas gostam de aproveitar seu tempo e como lidam com a falta dele por conta da rotina urbana.

Sorria,
É Sexta-Feira

por Luka Melero

Rio de Janeiro, 2013 | 10 min

Mesmo com experiência de iniciante, já descobri que o documentário é uma obra líquida e mutável até o fechamento de sua edição. O filme Sorria, É Sexta-Feira começou com a ideia de questionar, em meio ao trânsito de uma sexta-feira, como as pessoas gostam de aproveitar seu tempo e como lidam com a falta dele por conta da rotina urbana.

Sabíamos que algumas leis de trânsito seriam violadas, que algumas janelas se fechariam em nossa cara, mas havia a vontade de fazer. Até o momento em que fui selecionado para participar do Rumos, eu não fazia ideia de como seria fazer um filme dessa forma. O projeto recebeu verba e suporte, o que abriu muitas portas. Conseguimos autorização da concessionária responsável pela Ponte Rio-Niterói, nosso desejado plano de fundo, e de empresas de ônibus.

Em paralelo, o processo de pré-produção foi acompanhado pelo Itaú Cultural por meio de uma plataforma virtual, criada para que o projeto fosse discutido e orientado. Apesar das críticas à linguagem televisiva do projeto, foram poucas as mudanças conceituais no filme.

O resultado foi um documentário que começou como "cinema guerrilha" e terminou como um produto formatado e dentro de um prazo. A experiência de realizar um web-documentário com investimento privado modificou o filme se o compararmos a uma produção independente. No entanto, toda essa experiência é importante. Durante o processo de criação do trabalho, descobri dentro de mim um diretor que não conhecia, com um outro olhar. Isso tudo me fortaleceu e fiquei contente com o resultado final.

E agora, o que será do web-documentário?
Só a internet dirá.

Gamewhat

por Fábio Alves

Paraná, 2013 | 10 min

As novas mídias e suas inúmeras alternativas de conexão entre conteúdos e pessoas abriram outra frente de exploração para uma das atividades humanas mais prolíficas: contar histórias.

Documentário
para tocar

por Fábio Alves

Paraná, 2013 | 10 min

As novas mídias e suas inúmeras alternativas de conexão entre conteúdos e pessoas abriram outra frente de exploração para uma das atividades humanas mais prolíficas: contar histórias.

A narrativa clássica trazia para o cinema a possibilidade de apresentar histórias de maneira clara e fluente ao espectador, porém, contar uma história multimídia é diferente de tudo o que é permitido em suportes tradicionais, principalmente por permitir interferência e tantos caminhos que, como escreveu Umberto Eco sobre a web e seus links, "cinco passos, apenas, podem levá-lo de Platão à salsicha”.

Novo meio, novos recursos, novos paradigmas. Qual a particularidade do documentário para web? Como garantir a atenção em um ambiente de consultas rápidas e fragmentadas? De que forma é possível construir a interface e o roteiro? Ser diretor ou designer? Roteirista ou arquiteto da informação? Editor ou programador? Documentário para assistir ou para interagir? Ver ou tocar?

Em Gamewhat percebemos que, para trilhar caminhos entre documentário e web, é necessária uma formação multi e interdisciplinar. Apesar de fazer o mesmo que o roteirista de audiovisual, por exemplo, também é necessário pensar como webdesigner, como arquiteto de informação, como diretor de fotografia e como designer de interface. Pode parecer óbvio, mas essa foi nossa principal e mais desafiadora descoberta, em razão do número ilimitado de alternativas.

Existia apenas a sala de cinema. Agora temos a sala de casa, o escritório, o ônibus, a fila de espera. Não podemos mais chamar de espectador aquele que tem contato com uma história estruturada pelas novas mídias.

Comumente, ele é chamado de usuário. Se cinema é uma linguagem visual e auditiva, a web também é, mas pressupõe interação. Essa troca se dá tanto de forma mental, saber para onde se quer ir, quanto física, pois é necessário "acionar" o caminho, tocando na tela, manuseando o mouse, gesticulando para o detector de movimento, estando em determinada localidade etc.

As novas mídias abrem uma série de cenários ainda não totalmente explorados pela linguagem audiovisual. Há um processo de maturação da técnica pelo qual toda nova tecnologia passa ao ser incorporada ao fazer artístico. Mas não nos esqueçamos do papel principal de uma obra de arte, seja qual for o suporte: quebrar regras, subverter padrões, ser questionadora, experimentar novas sensibilidades, lançar novas hipóteses, propor relações e dialogar com seu próprio meio, criando reflexões estéticas e despertando consciências e novos pensamentos.

Sinoâncias

por Carol A. Gouvêa
André N. P. Azevedo

Minas Gerais, 2013 | 8 min 30 seg

Onde os Sinos Falam iniciou de um jeito e terminou de outro. Ganhou sonoridade, perdeu entrevistas, criou coragem. Até mudou de nome! Amadureceu? Talvez. O caso é que o projeto passou por um longo processo de mudanças e adaptações que o moldaram à forma final, em uma existência definida pelas possibilidades do web-documentário.

Sinoâncias

por Carol A. Gouvêa e
André N. P. Azevedo

Minas Gerais, 2013 | 8 min 30 seg

Onde os Sinos Falam iniciou de um jeito e terminou de outro. Ganhou sonoridade, perdeu entrevistas, criou coragem. Até mudou de nome! Amadureceu? Talvez. O caso é que o projeto passou por um longo processo de mudanças e adaptações que o moldaram à forma final, em uma existência definida pelas possibilidades do web-documentário.

Produzir um web-documentário significa abrir caminhos, ganhar espaço. É poder multiplicar um filme-base em
vários outros, adicionar fotos e textos, compartilhar informações, criar hiperlinks, abrir espaço para comunicação e intercâmbio de ideias.

Esse formato nos permitiu produzir um filme diferente, que instiga a curiosidade do espectador e o convida a conhecer um universo novo. Sinoâncias, nome final de nosso web-documentário, traz uma obra principal, basicamente sonora e visual, que retrata a linguagem dos sinos de São João del-Rei, Minas Gerais. O cenário das belas igrejas barrocas, aliado ao que se sente nas torres dos sinos, nos transporta a um mundo quase perdido, mas que ainda resiste nessa cidade mineira. No entanto, o assunto não se esgota no filme, que chega a depender de informações adicionais para ser completamente compreendido. Para conhecer os personagens dessa antiga tradição e entender melhor sobre a linguagem dos sinos, é preciso navegar pelo site, visitando diferentes links com textos, fotos e vídeos. Nele, é possível conhecer o personagem interessante dos sineiros, que humanizam a tradição ao mesmo tempo que a conceituam.

Para chegar a esse modelo final, um caminho longo foi trilhado. A proposta do Itaú Cultural de criar uma plataforma on-line onde os selecionados do Rumos Cinema e Vídeo

pudessem discutir o andamento da produção dos web-documentários foi indiscutivelmente uma grande chance de aprendizado. Graças à orientação de profissionais renomados do cinema, como Daniela Capelato, Karen Harley e Marcelo Gomes, entre outros, pudemos avaliar nossas obras criticamente e pensar em formas de deixá-las mais atrativas e consistentes. Discutimos o conceito de web-documentário e suas possibilidades e fomos instigados a buscar referências na área, conhecendo expoentes internacionais desse formato ainda pouco explorado no Brasil. Com a chance de sermos orientados por pessoas mais experientes que nós, não ficamos perdidos em
nossas produções.

Foi em razão de tanta ajuda, aliada à pesquisa, que entendemos nosso próprio projeto e decidimos ousar na construção do filme-base. Tínhamos em mente a produção de uma obra documental mais clássica e até um pouco jornalística, baseada em entrevistas. Esse formato, entretanto, se tornava muito limitado devido ao tempo curto proposto (dez minutos) e fechava as possibilidades para a web. Por fim, após erros e acertos, conversas e discussões pela plataforma on-line, conseguimos finalmente visualizar uma linguagem mais poética, mais cinematográfica, mais livre e mais sonora. Ao mesmo tempo, chegamos finalmente ao modelo de site que gostaríamos e às formas de disposição e interação de nosso web-documentário.

Sinoâncias se tornou, para nós, um verdadeiro aprendizado e expandiu nossas concepções sobre o web-documentário. Esperamos que signifique para todos que assistirem a ele um clamor – que os transporte para as torres dos sinos e os convide a conhecer mais sobre essa cultura.

Saltimbancos

por Camila Garcia

São Paulo, 2013 | 9 min

Em 2011, enquanto passava alguns meses no Canadá, tive o primeiro contato com o web-documentário: uma nova maneira de pensar como contar histórias reais. Me interessei logo de cara pelo modo como as ferramentas de interação e exibição que a internet possibilitava naquele seu nível tecnológico fragmentou e, consequentemente, ampliou o tradicional formato da narrativa documental.

Saltimbancos

por Camila Garcia

SÃO PAULO, 2013 | 9 min

Em 2011, enquanto passava alguns meses no Canadá, tive o primeiro contato com o web-documentário: uma nova maneira de pensar como contar histórias reais. Me interessei logo de cara pelo modo como as ferramentas de interação e exibição que a internet possibilitava naquele seu nível tecnológico fragmentou e, consequentemente, ampliou o tradicional formato da narrativa documental. Pioneiramente, o Canadá já apresentava web-documentários com sofisticados modos de interação, formatos de construção on-line com a integração de diversas mídias e experimentando o convívio com fotografia, texto, áudio, vídeo, animação e infográficos, de variados temas.

No Brasil, busquei meios de viabilizar a realização de um web-documentário sobre artistas de rua, tema ao qual sempre estive muito ligada e atenta pela minha aproximação com as artes, principalmente teatro, dança e circo. Encontrei a oportunidade no programa Rumos, do Itaú Cultural.

Independentemente do formato, encontrar o foco do documentário é sempre uma tarefa obrigatória, delimitar o recorte: o objeto e o ângulo de estudo são fundamentais para prosseguir. Tive grandes dificuldades nessa fase e os encontros on-line pela plataforma de discussão criada pelo Itaú Cultural foram bem-vindos, primeiramente porque tive a orientação e os conselhos de Daniela Capelato, mas também porque percebi que essa era uma dificuldade comum entre os realizadores. Não me senti sozinha e acredito que, durante um processo criativo artístico, ter pessoas ao seu redor contribuindo traz novas perpectivas a todos.

Não sabia ao certo os aspectos que gostaria de focar, porém, conhecia os que não queria abordar. Continuei minha investigação até encontrar minha real curiosidade em relação à presença do artista na rua. Notei que o histórico pessoal de cada um estava diretamente relacionado à escolha da forma de arte e ao porquê das apresentações nas ruas.

Originalmente, o projeto Saltimbancos previa a criação de uma plataforma on-line, onde o espectador é convidado à interação simples de escolher qual história ou artista gostaria de explorar primeiro. Pensava em vídeos curtos e independentes agrupados em uma timeline gráfica comum a todos: a Avenida Paulista. O usuário-espectador seria convidado a explorar esse espaço navegando com liberdade pela montagem, arrastando fotos da avenida, até encontrar um artista, quando seria possível reproduzir o vídeo.

O desenvolvimento do projeto atráves das interações e do acompanhamento da plataforma on-line apontou outros caminhos possíveis e ampliou o meu entedimento sobre o formato web-documentário. Comecei a conceber o site como um portal de cultura, um espaço capaz de armazenar uma boa quantidade de informações pertinentes às questões despertadas pelo vídeo inicial de dez minutos. A exploração desse conteúdo ocorre de forma a apontar caminhos a serem percorridos: são textos, fotos, fórum de discussão e vídeos de artistas de rua discorrendo sobre ocupação do espaço público, arte e democracia e sobre a Lei 489/2010, que busca regulamentar as atividades do artista de rua. >>

O interessante do formato web-documentário é que a construção da narrativa é personalizada pelo gosto, pela disponibilidade e pelo tempo do espectador. A elaboração do discurso ocorre simultaneamente à sua navegação. A possibilidade de o espectador criar uma narrativa subjetiva que desafia a lineariedade do formato clássico documental, por meio de suas escolhas, o impulsiona a tornar-se um agente ativo de reflexão, diálogo e formação de opinião.

Outro ponto relevante que observei como realizadora é que todas as informações contidas nesse portal estão condicionadas ao filtro que considero interessante e que estabeleci como foco para o projeto, porém, as repercussões e discussões advindas dessa experiência estão fora do meu controle. O web-documentário não é um produto fechado em si. Parece estar sempre aberto ao público e possuir a capacidade de ser moldado por ele, para mais longe ou mais perto. Assim como a perfomance de um artista de rua, o tempo de vida da narrativa web-documental está diretamente relacionado à duração do interesse do público.

Sinto que o Saltimbancos está apenas começando,
as possibilidades ainda são inúmeras e estão se revelando aos poucos. Um projeto aberto ao público e atrelado a uma ferramenta tão colaborativa como a internet agrega a si a possibilidade de ser global. É possível se criar
conjuntamente uma rede de difusão de vídeos focada nos artistas de rua presentes em todo o mundo, apimentar e ampliar a discussão da ocupação do espaço público e suas formas: uma tendência de criação coletiva na qual todos saem ganhando.

O PONTO CEGO

por Chico Bahia

São Paulo, 2013 | 10 min

O curta O Ponto Cego veio de um projeto um tanto quanto desconfortável de ser realizado, pelo menos na forma como ele foi, a princípio, idealizado. Ele se propunha a retratar A Experiência do Sujeito Genérico, que dava nome ao projeto. Um tema bastante vago, certamente, mas nem por isso longe de nossa realidade.

O ponto cego

por Chico Bahia

SÃO PAULO, 2013 | 10 min

O curta O Ponto Cego veio de um projeto um tanto quanto desconfortável de ser realizado, pelo menos na forma como ele foi, a princípio, idealizado. Ele se propunha a retratar A Experiência do Sujeito Genérico, que dava nome ao projeto. Um tema bastante vago, certamente, mas nem por isso longe de nossa realidade. Pensando bem, talvez qualquer filme se torne desconfortável de se fazer se olhamos para todas as relações presentes no processo que envolve a sua realização. Não que isso apareça nos filmes, talvez em alguns poucos, mas não foi o nosso caso.

Que cada um de nós é sujeito genérico nos parecia claro, ainda mais num mundo como o de hoje. Somos genéricos ao esperar na fila do supermercado, ao passar nas catracas do metrô e ao sermos contratados em um emprego qualquer.

Imageticamente, o filme seria construído através de uma perspectiva das mais genéricas, trabalhando com imagens do Google Street View. O olhar do Google é o aleatório, mantém sempre uma elevação igual e fotografa da mesma forma as cenas das ruas.

Porém, tínhamos que escolher com quais das infinitas imagens do Google iríamos trabalhar. Resolvemos, por qualquer motivo, que seria Paraisópolis, bairro da capital paulistana. No filme, um narrador desconhecido, genérico, caminharia virtualmente pelo local (como é possível fazer via Google Street View).

A ideia era transformar a própria perspectiva maquinal do Google no olhar do personagem, o sujeito genérico.

Bom, mas o que um “sujeito genérico” diria? Como reagiria ao que vê? Como criar um personagem genérico? Não seria demasiada obviedade colocar frases prontas em sua boca e dar um tom maquinal à sua voz para tornar ele tipicamente genérico? Pois, afinal, todo personagem se cria e, se somos todos sujeitos genéricos, todos temos também nossos medos, ansiedades, expectativas e desejos; somos todos também bastante particulares. Por mais que a lógica imperante nos trate e faça com que nos tratemos uns aos outros como genéricos, ela não muda o fato de sermos ao mesmo tempo muito diferentes uns dos outros.

O projeto previa a captação de som in loco para compor o percurso virtual do personagem. Saímos de nossos passeios virtuais por Paraisópolis e fomos fazer o curta lá de fato. A alguns metros de um incêndio nuns barracos de madeira da favela, gravamos uma entrevista com um assíduo ouvinte de Amado Batista. Uma situação genérica? O que tínhamos até então era isso para fazer um filme: uma ideia abstrata e um impacto violento bem concreto sentido em nossa presença no bairro.

O projeto, naquele momento, precisava de mudanças, era necessário dar carne e osso ao tal sujeito genérico, criar um conflito do encontro dele com a realidade. Dar carne e osso ao personagem significou, para nós, dar a ele um emprego: foi mais fácil construir um personagem genérico por meio de seu trabalho. Ele foi contratado no roteiro como um instalador de câmeras de vigilância, um trabalhador que lida com imagens, que pudesse significar sua própria navegação no Google e as imagens das câmeras que instala. >>

Quando íamos até lá, éramos frequentemente confundidos com vigilantes e policiais. Muitos moradores achavam que estávamos ali filmando algo ilícito ou secreto.

A partir disso fizemos incessantes exercícios de roteiro. Pilhas e pilhas virtuais de páginas. Diversas pessoas dando ideias, fazendo críticas. Dois cortes diferentes foram feitos. Ao mesmo tempo que isso acontecia, íamos a Paraisópolis.

Primeiro para captar imagens que simulavam câmeras de segurança, do alto da varanda das casas. E assim, de uma maneira bem contraditória, fomos construindo relações com as pessoas do bairro. Ao final de diversas idas para lá, o bairro já não nos era tão estranho, reconhecíamos os lugares, as pessoas, e nos envolvíamos com o local.

Essas relações que íamos estabelecendo alimentavam o roteiro do filme; pessoas de lá passaram a compor os personagens que pensávamos construir. E o filme aos poucos ia tomando vida própria, ele mesmo estabelecendo as relações entre nós e as pessoas de Paraisópolis. O projeto desconfortável passava a ser bem possível de ser realizado, afinal, as coisas entravam no eixo. Mas o encontro e a retratação de uma realidade tão distinta da nossa demandava tempo, o que não tínhamos. E por que era necessário mais tempo? Porque o filme precisava registrar, em meio a sua história, nossa experiência no bairro, baseada nas conversas nas vielas e na nossa observação.

Caminhos e descaminhos. Coisas que não podiam ser previstas num roteiro.

No final das contas, construímos uma história com alguns elementos de nossa vivência lá. Não que ela tenha esgotado as possibilidades que a experiência em Paraisópolis propicia, mas alguns elementos do filme remetem à nossa presença no bairro e às relações que estabelecemos lá. De resto, o filme se junta aos milhares de filmes genéricos que vemos por aí e nem por isso sabemos sobre as relações pessoais que a sua produção estabeleceu. Fazer um filme que contenha reflexivamente a experiência de fazê-lo e, além disso, que abranja as múltiplas histórias de Paraisópolis continua sendo um ponto cego para nós.

O centro invisível

por Tiago Pedro

Ceará, 2013 | 9 min

Todo processo de criação de um filme é uma angústia constante. O movimento de criação de um documentário, de encontro do realizador com seu tema, é lento, uma lapidação permanente com suor, autoconhecimento e mergulho em sentimentos. Esse movimento de organização e divagação parece fácil, mas não é. Nesse sentido, a orientação dos consultores do Rumos foi essencial.

O centro invisível
no centro das coisas

por Tiago Pedro

Ceará, 2013 | 9 min

Todo processo de criação de um filme é uma angústia constante. O movimento de criação de um documentário, de encontro do realizador com seu tema, é lento, uma lapidação permanente com suor, autoconhecimento e mergulho em sentimentos. Esse movimento de organização e divagação parece fácil, mas não é. Nesse sentido, a orientação dos consultores do Rumos foi essencial.

Saber que temos pessoas interessadas em nos orientar,
que acreditam em nosso trabalho e buscam nos entender como artistas foi uma grande motivação nesse processo
de escrita imagética.

Este filme é múltiplo, como as plataformas da web; meus impulsos de criação se completam em cada espectador, em cada coração que poderá sentir o poder da poesia imagética, do quadro que não se detém. O vídeo físico tem duração limitada, a obra é aquela. O artista e sua equipe sentem que, em algum momento, têm que parar e vê-lo: está feito. O mesmo não acontece com a plataforma de apresentação, onde insistimos em tentar completar o filme, transmitindo a angústia de viver numa cidade invisível, feia, numa constante pulsão de não ver, de não respeitar a beleza, o bem viver.

Mesmo diante do universo de possibilidades, montagens, imagens, temas, links e hiperlinks, alguma hora o artista entrega sua obra. No nosso caso, entregamos à internet, para uso e apreciação dessa ferramenta – que a princípio me parece infinita, assim como a capacidade de imaginar.

Todo o processo foi de entrar em contato com sentimentos, com modos de se relacionar com o atual movimento urbano de Fortaleza, essa cidade de cicatrizes. Como morador, como amá-la?

Nosso filme é essa poesia visual e virtual entre mundos, que se completa na multiplicidade de sentimentos e nas possibilidades da internet.

se eu demorar uns meses

por Giovanni Francischelli

São Paulo, 2013 | 10 min

As transformações no campo da comunicação não são mais uma promessa, mas a realidade que experimentamos cotidianamente. A geração de nativos digitais, um grupo de indivíduos que já nasceu imerso no mundo digital, utilizando o computador e a internet como ferramentas indispensáveis ao seu dia a dia, não para de crescer.

As novas potências
do documentário

por Giovanni Francischelli

SÃO PAULO, 2013 | 10 min

As transformações no campo da comunicação não são mais uma promessa, mas a realidade que experimentamos cotidianamente. A geração de nativos digitais, um grupo de indivíduos que já nasceu imerso no mundo digital, utilizando o computador e a internet como ferramentas indispensáveis ao seu dia a dia, não para de crescer. Se esses novos padrões são um caminho sem volta para as comunicações, como esse movimento se reflete no campo dos documentários? Será que uma prática que historicamente experimentou diferentes meios e linguagens graças aos avanços tecnológicos pode ficar incólume a todas essas transformações?

Da substituição do cinematógrafo por câmeras mais leves (anos 1920), passando pela introdução do som e seu uso criativo (anos 1930); do surgimento de câmeras com som sincronizado (anos 1960) até a introdução do vídeo (anos 1980) e do digital (anos 1990), sempre vimos o desenvolvimento de novas práticas para o “tratamento criativo da realidade”, citando a definição clássica de Grierson para documentário. Se existe essa relação direta entre os modos de representação e as ferramentas disponíveis em cada era, somos levados a pensar em possibilidades e expectativas extraordinárias para um tempo em que escrevemos a história a todo instante, postando e publicando informações, compartilhando e registrando dados e coordenadas a cada segundo.

Mas é preciso não se iludir. As informações postadas no incomensurável magma da internet são excessivas,

dispersas e confusas. Produzimos, nas últimas décadas, um volume de informação maior que a soma de séculos anteriores, e ainda procuramos uma forma de compreender o fenômeno. Preencher de significado e subjetividade esse mundo virtual, paralelo e mediado parece ser um dos grandes desafios para a arte contemporânea, ao menos para os realizadores comprometidos em utilizar as novas tecnologias a serviço de um ponto de vista e de um significado.

Os web-documentários parecem ser uma ferramenta de grande potencial criativo para preencher de sentido a experiência na web. Sentados na frente do computador, diante de um monitor ou celular, ou, em um futuro próximo, diante de televisores digitais integrados, o desafio para os realizadores sempre será o de criar obras que se inscrevam no tempo, que possam transcender a experiência comunicativa, construir conhecimento e interferir na realidade de cada espectador.

Como são cada vez maiores as possibilidades de troca
e consumo de informação, precisamos observar com cuidado como elas serão absorvidas pelas sociedades e pelos indivíduos imersos nessa nova realidade.
Os protocolos com base em internet têm muitas vantagens: permitem que se escolha e assista ao que se quer ver, na hora em que se quiser; possuem menos custos de armazenagem e distribuição e não há os limites de grade de programação, de forma que parece possível que se disponibilize uma variedade praticamente ilimitada >>

de conteúdos em um modo de comunicação e interação completamente novo entre autor e espectador. Mas é necessário que a experiência do público não seja resumida à propagação de conteúdos de forma favorável e controlada. Pensando no caso brasileiro, onde poucos municípios possuem salas de cinema, mas que praticamente todos possuem acesso à internet, é importante reavaliar a forma como pensamos e fazemos audiovisual, buscando caminhos efetivos rumo à democratização do acesso e do consumo cultural. Sem ter de enfrentar o preço dos ingressos, a concorrência com os produtos norte-americanos e as limitações impostas pelas grandes redes de televisão, a produção independente pode encontrar na web uma oportunidade única de distribuição e acesso.

Esse é um eixo fundamental para pensarmos maneiras de transformar uma cinematografia latino-americana, que historicamente viu negada a possibilidade de chegar ao grande público de forma sistemática e sustentável. As dificuldades enfrentadas pelo cinema no continente jamais foram causadas por falta de ideias ou energias para a produção de filmes, mas, justamente, pela necessidade de se enfrentar esse contexto de ocupação dos mercados de distribuição e exibição. Em um país como o Brasil, cuja cinematografia apresenta uma trajetória em que, como descreveu Paulo Emílio Salles, “o subdesenvolvimento é um estado e não uma etapa ou estágio”, pensar novos formatos é estar diante dos desafios para se firmar um sistema de produção regular e sustentável, onde a produção de obras possa significar mais do que um amontoado
de experimentações marginais.

 

Trans*Lúcidx

por Tamíris Spinelli

Paraná, 2013 | 10 min

Ao iniciar a pesquisa de Trans*Lúcidx, ainda na elaboração do projeto, eu pouco sabia sobre a existência de web-documentários e, menos ainda, sobre possíveis definições e convenções que acompanham o termo. Meu projeto, no entanto, tinha como base de pesquisa o ambiente da web, em específico vídeos documentais publicados on-line por pessoas trans. Pensei: “Interesso-me pela web e pelo procedimento documental, deve fazer algum sentido participar dessa convocatória”.

Trans*Lúcidx

por Tamíris Spinelli


1 A grafia “trans*” é usada dentro da comunidade para designar todos os indivíduos que passam por algum tipo de transição de gênero física ou social, uma vez que o termo “transexual” tem o sentido fechado da passagem de um sexo para outro, sem abranger os entre-gêneros.

Paraná, 2013 | 10 min

Ao iniciar a pesquisa de Trans*Lúcidx, ainda na elaboração do projeto, eu pouco sabia sobre a existência de web-documentários e, menos ainda, sobre possíveis definições e convenções que acompanham o termo. Meu projeto, no entanto, tinha como base de pesquisa o ambiente da web, em específico vídeos documentais publicados on-line por pessoas trans1. Pensei: “Interesso-me pela web e pelo procedimento documental, deve fazer algum sentido participar dessa convocatória”.

Iniciada a pesquisa do filme, eu e Caio Riscado, que convidei para ser diretor-assistente, assistimos a horas e horas de material disponível on-line.
Por semanas seguidas, debatemos sobre ele, nos emocionamos e envolvemos nossos próprios corpos na construção da narrativa de cada um dos personagens.
Esses corpos eram também os nossos corpos.

O espaço da web permitiu essa mistura. Foi perceptível o impacto que tem na vida das pessoas o diálogo entre oceanos, a soma de forças, as ajudas e os conselhos. Quando alguém liga uma câmera e mostra seu corpo diante dela, esse corpo passa a existir. E os corpos sobre os quais nos debruçamos são corpos inexistentes na maioria dos outros espaços; corpos que, em toda a sua potência política e transformadora, são apagados, esquecidos – muito provavelmente por serem potentes e transformadores.

Poderíamos pensar, então, que nossa busca era denunciar
a invisibilidade. Mas não, misturados que estávamos, como corpos de carne e osso diante dos corpos-pixel, nos deixamos modificar. E, deste processo de modificação pessoal, surgiu o discurso do filme.

A web permitiu também o diálogo constante, que se deu em uma plataforma de discussão criada pelo Itaú Cultural para acompanhamento e debate entre os diretores participantes e alguns mediadores convidados. Foi ali que as arestas foram aparadas, que o processo imersivo foi codificado. E isso foi importante para que o filme, apesar de trabalhar com subjetividades, pudesse afinar seu diálogo com seu público. Também foi importante objetivar conceitos que embasaram sua construção narrativa e textual. O roteiro do filme foi construído durante esse processo, sendo fruto tanto da pesquisa quanto desse diálogo.

Com tanta influência da web em sua construção e com lançamento previsto também nesse espaço, poderia ser óbvia a classificação do filme dentro do termo
web-documentário. No entanto, ainda hoje – com o filme finalizado e um conhecimento considerável sobre o tema – me questiono se, de fato, Trans*Lúcidx
é um web-documentário.

Se for, é um discurso contaminado por outras referências do audiovisual misturadas à web e às minhas vontades pessoais em relação a linguagem. Afirmo isso porque, apesar de não ser novo o debate sobre os limites entre o documentário e a ficção, quando nos referimos ao termo documentário, parece sempre que existe um compromisso com a informação, com a objetividade.

No entanto, se é múltipla a web, tem de ser múltiplo também o termo. Se o documentário feito para as telas de cinema já se reinventa – repensando o que se entende por “real” ou “verdade” –, o documentário para web, que surge posteriormente, já nasceu reinventado. Ou, no mínimo, com uma abertura maior para constantes reinvenções.

Osso da fala

por Sheyla Smanioto e
Raphael Picerni

São Paulo, 2013 | 10 min

Tem vezes que a gente fala e tem mais silêncio que palavra, e tem muita palavra escondendo a fala, e a fala se mostra apenas no osso da fala, no que espreita dentro de toda tentativa de não estar sozinho.

Osso da fala

por Sheyla Smanioto e
Raphael Picerni

SÃO PAULO, 2013 | 10 min

Tem vezes que a gente fala e tem mais silêncio que palavra, e tem muita palavra escondendo a fala, e a fala se mostra apenas no osso da fala, no que espreita dentro de toda tentativa de não estar sozinho.

Começamos este projeto pensando que a pergunta fosse “Como falar sobre a falta?”. Mas, no contato com
as pessoas, através de e-mails, mensagens, conversas e entrevistas, as perguntas se mostraram outras: “Sobre o
que as pessoas falam quando falam de construção, de café, de tardes de domingo?”; “Sobre o que as pessoas não podem falar quando têm que falar de café, construção
e tardes de domingo?”.

O esforço de montagem foi o de encontrar, entre todas as conversas, entre horas de entrevistas, o que precisasse ficar. O osso da fala. Optamos não por contar a história de cada um desses personagens, mas por colocá-los em um fluxo
de falas e imagens que constituíssem o personagem que faltava. A falta ou sua personificação: a pequena
e impossível Rebeca, de Cem Anos de Solidão, arrastando seu saco de ossos pelo chão de Macondo.
Afinal, começamos essa empreitada com um convite nas redes sociais, que perguntava: “Qual é o seu saco de ossos? Quais objetos você mantém consigo para lembrar da ausência que a morte cava? Os ossos, como os objetos,

costumam ficar mais do que os homens. E neles fica também a marca dessa necessidade de ter alguma coisa que fique, que resista, mesmo que dentro de objetos quebrados, de sonhos não realizados, de uma fala que não encontrará ponto final”.

O que parece ficar, sobretudo, é o pulso da fala, a necessidade dela.
Seu osso.

Clique no link abaixo
e saiba mais sobre o projeto.

http://ossodafala.wordpress.com