curatorial

Mostra panorâmica de um artista na terceira margem do rio

É uma mostra panorâmica porque, ao longo de vários períodos e com diversas linguagens, Guto vem se apropriando do universo em que habitamos, ressignificando objetos e subvertendo raciocínios para nos dar acesso, por meio de suas obras, a um mundo paralelo que até então não era visível, porque simplesmente não sabíamos que existia ou porque nos parecia desimportante. 

É panorâmica, ainda, porque apresenta um artista que, há mais de 40 anos, tem operado com praticamente todas as expressões artísticas. Cinema, performance, pintura, desenho, escultura, instalação, cenografia, poesia visual, artes gráficas e edição são mares pelos quais Guto navega, sempre reconhecido por colegas, público e crítica. 

E é também uma exposição processual, por nos permitir entrar em contato com o processo criativo do artista. Guto conta que inventou um “pseudométodo”, que chama modestamente de convivência lúdica, consistindo em deslocar um objeto de seu habitat natural e observá-lo atentamente por um longo tempo, o que permite ampliar a percepção sobre ele e atribuir novos significados e possibilidades de aproximação. Ao investigar o mundo com seu olhar ferino, Guto injeta seu espírito crítico naquilo que vê, produzindo obras de arte às vezes de singeleza e simplicidade absolutas, às vezes complexas e monumentais. 

Dono de um raciocínio lógico irrepreensível e de uma percepção ácida e mordaz, o artista nos conduz, de maneira sempre delicada e valendo-se da metáfora, do humor sutil e da ironia fina, a portais para um mundo no qual objetos domésticos e prosaicos adquirem novas funções, transformando-se em “desobjetos”, ou objetos disfuncionais, cuja função é surpreender o observador, provocando espanto, estranhamento e, finalmente, um sorriso. 

Paradigmática dessa operação é a obra A terceira margem do rio, em que uma canoa virtual aporta, por meio de um jogo de espelhos, na margem imaginária desse outro mundo, pronta para que embarquemos no passeio maravilhoso que é a obra de Guto Lacaz.

Desejamos a todos uma boa viagem. 
‍Kiko Farkas e Rico Lins